outubro 31, 2008

Blog # 215

O Conselho Nacional da Educação vem propor que acabem os chumbos até ao 9.º ano – é uma medida e tanto, que o sr. Secretário de Estado Valter Lemos festeja com as mãos ambas, uma vez que parece ser ele o encarregado de velar pelas estatísticas. Acho que o sr. Secretário Lemos está a ser modesto em matéria de "mecanismos de alternativa a chumbos". Penso que, na hora do baptismo, perdão, no registo civil, seja atribuído logo o 9.º ano a cada pequeno cidadão. Assim, evitam-se logo os chumbos. Parece, além do mais, que o chumbo é visto como uma tentativa de responsabilizar os alunos e os pais, o que – no entender do sr. Secretário Lemos e do sempre espantoso Albino Almeida, da confederação dos paizinhos – não pode acontecer. Sim, de facto, onde é que isto se viu? Na Finlândia?

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'O Filho Eterno', de Cristóvão Tezza, é o livro que ganhou o prémio Portugal Telecom no Brasil – vai ser publicado pela Gradiva em Novembro. É uma pequena maravilha, o relato comovido do pai de uma criança com síndrome de Down.

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FRASES

"Eu sei quem me agrediu. Tenho aqui num papel." Leonor Cipriano, no tribunal, ontem no CM.

"A minha mãe obrigou-me a vir ao blogue um bocadinho." Rogério Casanova, no blogue Pastoral Portuguesa.

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outubro 30, 2008

Fugas de Inverno


O Público vai lançar uma edição especial da revista Fugas no dia 8 de Novembro – a Fugas de Inverno –, dedicada às férias de Inverno, disponibilizada gratuitamente com o jornal. A edição vai incluir diversas propostas de destinos turísticos. Os conteúdos vão abordar locais de frio e neve, mas também de praia e aventuras no deserto.

A Fugas de Inverno vai trazer as histórias de Elisabete Jacinto, João Garcia e Francisco José Viegas. Paralelamente, será apresentado a colecção de vinhos de Inverno de Rui Falcão e a recomendação de David Lopes Ramos de restaurantes para a estação.

in Diário Digital - 30.10.2008

É um crime



Nove destemidos autores portugueses aceitaram o desafio de escrever um conto policial. O resultado desta perigosa experiência é um tiro certeiro: nove contos policiais de alto calibre!Muito cuidado com os textos de: Dulce Maria Cardoso, Francisco José Viegas, Gonçalo M. Tavares, Hélia Correia, Mafalda Ivo Cruz, Mário Cláudio, Rui Zink, valter hugo mãe. E com a estreia de Ricardo Miguel Gomes.

Coordenada por Pedro Sena-Lino, esta colectânea de Contos Policiais é a obra inesperada do ano, com incalculável valor literário.

Perigo de vida, leia já!

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Blog # 214

O‘caso Esmeralda’ não é folclore. Convém, para pessoas sensíveis e cosmopolitas, pensar que o drama de uma criança dividida por duas famílias é apenas uma coisa provinciana e pouco digna de figurar nas páginas dos jornais – quanto mais da nossa vida. Mas acontece que os tempos modernos não são apenas uma metáfora para nos mostrarmos mais luminosos e agradáveis. Com eles vêm as famílias monoparentais, pluriparentais ou o que quiserem – e novas formas de manifestar em público o afecto que nasce em privado. A história do nascimento de Esmeralda tem a ver com tudo isso e com uma soma de decisões judiciais que acabam por ser contraditórias ou discutíveis, quando pretendiam fazer justiça a todo o custo. Não há justiça nestes casos. Há apenas o sentimento do irremediável.

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Quem disse que as mulheres bonitas escrevem mal? Esteja atento e espere pelo novo livro de Maité Proença, a publicar pela Oficina doLivro na semana que vem. No Brasil, subiu aos tops. Em Portugal, entra, para já, nas livrarias.

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FRASES

"Nunca soube que havia lá um mandado de entrega da Esmeralda" - Vítor Manuel, agente da psp do entroncamento ontem no CM.

"Pode-se ser pelos direitos sexuais e surdo aos direitos sociais, culturais e políticos" - Luís Januário no blogue a natureza do mal.

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outubro 29, 2008

Blog # 213

Parece que o PS tem, agora, a sua guerra das bandeiras. A propósito do Estatuto Político-Administrativo dos Açores o PS estica a corda como se não o fizesse – a tarefa tem cabido a personagens de segundo plano (o primeiro-ministro declarou não estar esclarecido sobre o tema), disponíveis para a disputas de arrabalde com o Presidente da República. Não é matéria para uma guerra no sentido nobre do termo, embora esteja em causa um certo número de pendências estratégicas, entre elas a possibilidade de "chatear Cavaco" e de ganhar votos com isso. Bem vistas as coisas, a menos que se tenha tratado de uma manigância para ganhar as eleições regionais, só assim se explica que o PS mantenha as suas posições contra a posição do Presidente e dos constitucionalistas mais eminentes.

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Um dos sinais de que se aproxima o final do ano: acaba de ser publicado o guia de vinhos de João Paulo Martins (Livros d'Hoje/Dom Quixote), que já vai no seu 15º ano consecutivo. Já vi: muito bons vinhos do Douro, naturalmente. Hips!

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FRASES

"Os amigos não são para as ocasiões. Os amigos são raríssimos e preciosos." Filipe Nunes Vicente, no blogue Mar Salgado.

"A situação tornou-se insustentável." Domingas Velez, presidente demissionária do Conselho Executivo de uma escola básica de Beja, devido à violência. Ontem no CM.

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outubro 28, 2008

Blog # 212

José Eduardo Agualusa escreveu um livro notável, 'O Vendedor de Passados', em que o personagem principal se dispunha a isso mesmo – a inventar o melhor passado possível para cada um dos seus clientes. Quem não quer ter um bom passado, altamente recomendável? A luta política em Portugal, longe de esgrimir argumentos e propostas, vale-se frequentemente da trafulhice de combater o passado dos adversários (se possível esquecendo o próprio). É um método como qualquer outro, disponível nos manuais – mas há-de acabar por rebentar nas próprias mãos do utilizador. Há sempre uma vergonha escondida, uma distracção, um gesto menos próprio, uma coisinha humana e natural que atraiçoa os defensores da moralidade ou os super-homens impolutos. As pobres viúvas de Lorca são o pior da política.

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Amanhã, na Livraria Pó dos Livros, em Lisboa (Marquês de Tomar, 89), Francisco Louçã diz que livros anda a ler e conversa com Pedro Mexia, Fernanda Câncio e Rui Tavares, que lhe fazem uma pergunta: "E se fosse primeiro-ministro?"

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FRASES

"Há uma maior receita, pois aumenta o número de prevaricadores." Carlos Barbosa, presidente do ACP, ontem no CM.

"O Estado ajuda as construtoras com projectos, as construtoras criam emprego em ano de eleições." João Miranda, no blogue Blasfémias.

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outubro 27, 2008

Blog # 211

José Medeiros Ferreira chamou a atenção para este assunto no sábado passado: a Comissão Europeia, para que não a acusassem de não prestar atenção aos detalhes, já enviou para o Parlamento Europeu uma proposta que autoriza a utilização de 'scanners' nos aeroportos. Para quê? Para ver os cidadãos por dentro – uma ideia que faria as delícias dos adolescentes de há uns anos quando se sonhava com câmaras fotográficas que eliminassem as roupas. Pois a Comissão Europeia consegue, por lei, obter aquilo que nós apenas imaginávamos na nossa adolescência cheia de hormonas, libido e apetites. Blimunda, a personagem de Saramago, no 'Memorial', também via as pessoas por dentro desde que estivesse em jejum. Para a Comissão Europeia basta-lhe uma lei. Não precisa de imaginação nem de juízo.

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É um dos melhores restaurantes portugueses, o DOC, ali ao lado do Pinhão. Celeste Pereira (texto) e Nelson Garrido (fotos) escreveram um livro sobre a admirável arte de Rui Paula, o chef do DOC: "Uma cozinha no Douro" (edição Quid Novi).

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FRASES

"O mal globaliza-se mais depressa do que o bem." António Bagão Félix, ontem no CM.

"O que eu mais gostei na entrevista de José Sócrates foi o casaco." Rodrigo Moita de Deus, no blogue 31 da Armada.

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outubro 24, 2008

Blog # 210

Em Espanha, o juiz Baltasar Garzón declarou-se competente para julgar os crimes do franquismo. Aliás, iniciou o processo com o pedido de uma certidão de óbito do ditador e prepara-se para qualificar os crimes do franquismo como 'crimes contra a humanidade', desqualificando o pacto de 1977, que amnistiava os crimes da guerra civil. Garzón – e uma enorme quantidade de gente bem intencionada, mas vaidosa e cheia de certezas – gostaria de moldar a humanidade pelas ideias e hábitos de hoje. É fácil julgar o franquismo, como é fácil julgar o salazarismo, se se quer apenas um veredicto. Mas em Espanha tratou-se de uma guerra civil; Garzón acha que não basta o juízo da história e o castigo do tempo – é necessário alimentar a sua vaidade pessoal e o ressentimento dos contemporâneos.

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A Guerra e Paz acaba de publicar 'Foice e Martelo', do jornalista inglês Ben Lewis – trata-se, nada mais nada menos, do que uma recolha substancial (e respectiva análise) de anedotas sobre o comunismo. E de anedotas comunistas.

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FRASES

"Saiu Correia de Campos e bem se pode morrer nas ambulâncias que já ninguém se indigna." Helena Matos, no blogue Blasférmias.

"São todos uns maricas, umas senhoras." Gonçalo da Câmara Pereira, sobre a direcção de programas e a produção da SIC, ontem no CM.

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outubro 23, 2008

Blog # 209

Vêm aí tempos de dúvida. Basta estar atento ao que diz o primeiro-ministro: "Neste momento todas as famílias portuguesas precisam da ajuda do Estado." Agradecido, pela minha parte. Na verdade, temo muito que o Estado se habitue ao papel de ser "precisado" e se meta mais do que o necessário na vida das famílias – para não falar da das empresas. Em situações de crise e turbulência, a primeira coisa de que as pessoas abdicam chama-se liberdade. Vem, depois, um rol interminável de atropelos e de exigências. Tudo em nome do Estado. Não é que o primeiro-ministro vá de casa em casa meter-se na nossa vida, mas alguém há-de fazê-lo em seu nome mesmo que não esteja autorizado para tal. Primeiro, o Estado ajuda; depois, cobra. O problema é que costuma cobrar muito para lá do aceitável.

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Luis Sepúlveda chega hoje a Lisboa, ao fim da manhã — vem apresentar o seu novo livro de contos, 'A Lâmpada de Aladino' (Porto Editora). Há muito que o chileno não publicava textos originais. E já anunciou. Novo livro à sua agente.

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FRASES

"Só faço um apelo ao ladrão, que pegue no disco rígido e mo devolva." Miguel Sousa Tavares, ontem no CM.

"Não me consigo livrar de me imaginar no mundo de Blake & Mortimer." José Pacheco Pereira, no blogue Abrupto.

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outubro 22, 2008

Blog # 208

Há cerca de vinte anos eu dava aulas numa universidade. Um dia lembrei-me de falar de 'A Cidade e as Serras' – em trinta alunos, só dois tinham lido. Como era uma turma de 4º ano e de formação de professores, achei que deviam ler o livro. Choque e pavor. Percebi depois quando uma aluna me explicou que tinha aulas de psico-pedagogia, pedagogia, didáctica, história da educação, administração escolar, legislação escolar – e até uma para lhes ensinar a usar projector de slides ou retroprojector. Não tinham tempo para ler. Ou seja: sabiam como ensinar e manusear toda aquela geringonça – mas não tinham nada para ensinar. Para pôr lá dentro. Vinte anos depois, vai por aí uma grande festança com o 'Magalhães'. Números de circo e tal. Mas duvido que saibam o que pôr lá dentro. Pobres professores.

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A ler, urgentemente: 'Verdade, Humildade & Solidariedade. O Método dos Executivos do Futuro', de João Ermida (Livros d'Hoje) – onde se explica que 'a crise financeira' é, antes de mais, crise de valores e gestão danosa. Um livro fundamental.

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FRASES

"Ele guardava aqui muita pornografia em casa e obrigava-me a fazer filmes. Se não o fizesse, batia-me" Imigrante brasileira, ontem no CM.

"Como um verdadeiro Grande Líder, o primeiro-ministro não dá descanso ao seu povo." Sofia Vieira, no blogue Controversa Maresia.

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outubro 21, 2008

Blog # 207

Parece, de acordo com a notícia do CM de ontem, que os serviços centrais do fisco estão alarmados com os crescentes pedidos de indemnização que os contribuintes têm tido a coragem de levar aos tribunais – contra, imagine-se!, o fisco. Tamanho despropósito (processar o fisco!) só é possível porque existe uma lei que pune o Estado quando este se porta mal com o cidadão e que impõe o dever de ressarci-lo (indemnizar, compensar). O presidente da República bem alertou, quando a lei foi aprovada: cuidado, que isso vai ter impacto nas contas gerais da nação. Pois tem, e o fisco já mobilizou dezenas de juristas para tratar das queixas dos contribuintes, a ver se pára a despesa. É bom, pois, que o Estado perceba qual o seu lugar e o seu poder – e que os cidadãos o respeitem, não o temendo.

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'Envios. Uma Experimentação Filosófica na Internet', de José Bragança de Miranda (edição Vega) recolhe textos que o professor e filósofo publicou no seu blogue Reflexos de Azul Eléctrico: uma espécie de dicionário do mundo, de A a Z.

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FRASES

"Este ano já é a segunda vez que fico sem nada e com a vida destruída." Everton Chanan, 30 anos, vítima das inundações de Lisboa, ontem no CM.

"[Os políticos açorianos] são todos muito 'autonomistas' até se fartarem da 'autonomia'." João Gonçalves, no blogue Portugal dos Pequeninos.

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outubro 20, 2008

Blog # 206

Santana Lopes e Manuela Ferreira Leite fazem parte do mesmo partido? Menezes faz parte do mesmo partido em que milita Pacheco Pereira? O que os une para lá do facto de não votarem PS? O que os une para lá do cartãozinho laranja? O medo. Sobretudo o medo de que, dividindo-se o PSD, fique o espectro político entregue ao PS de Sócrates, que devora o centro e que há-de querer emergir como o pai da pátria. Isso há-de acontecer mais tarde ou mais cedo num país em que os professores são a cantar o Malhão em honra do computador Magalhães, um provincianismo digno da Mocidade Portuguesa. A história ensina que o medo é mau conselheiro. E que não se pode defender um programa quando se está refém de compromissos com o demónio. Santana e Leite podem estar juntos – mas não é um partido.

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José Eduardo Agualusa é o autor da peça 'Aquela Mulher', que no sábado passado subiu ao palco em São Paulo, interpretado por Marília Gabriela: uma ficção sobre o momento em que Hillary Clinton toma posse como presidente americana.

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FRASES

"Pois o remédio é simples: uma parte do PSD sai e reorganiza-se." Filipe Nunes Vicente, no blogue Mar Salgado.

"Portugal tem problemas em gerir talentos." Quique Flores, treinador do Benfica, ontem no CM.

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outubro 17, 2008

Blog # 205

O empate de Portugal contra a Albânia é o prenúncio de um desastre apetitoso. Estádios ainda novos, claques excitadas, a pátria em chuteiras e calção, a glória recente, os melhores na bola – e isto? Longe da pátria, limito-me a ver as coisas à distância e a longo prazo: vai poupar-se um tanto se a selecção não for à África do Sul e veremos futebol na televisão sem estarmos dependentes dos habituais especialistas em patriotismo de algibeira. Por mim, impedia estes rapazes de ir à África do Sul – basta-nos esta vergonha caseira vivida em Braga. Devíamos esconder o acontecimento, arquivá-lo e considerá-lo coisa arrumada. Quanto aos jogadores, dar-lhes tratamento e moderar aquele apetite pelo estrelato, que faz de nós parvos. Voltemos à televisão para ver futebol estrangeiro.

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Anteontem à noite, numa festa privada, Paulo Coelho comemorou 100 milhões de livros vendidos. Cantou (com Gilberto Gil), bebeu, fumou. À meia-noite, o Prémio Planeta, em Espanha, dava 600 mil euros a Savater. Não me venham com ninharias.

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FRASES

"A Presidente do PSD troca as convicções pela possibilidade de ganhar eleições em Lisboa. " Pedro Marques Lopes, no blogue Atlântico.

"O Governo corta em quase todos os benefícios que tinha criado." Hélder Pedro, Associação Automóvel de Portugal (ACAP), ontem no CM.

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outubro 16, 2008

Blog # 204

Manuela Ferreira Leite, mesmo se quisesse falar diariamente para a imprensa (e é desejável que o não siga esse caminho), não poderia fazê-lo: Sócrates secou o PSD e o resto do CDS – na economia, na administração pública, na gestão da maior parte dos interesses do Estado, José Sócrates fez o que a direita sempre quiz fazer mas teve medo de fazer. Faltou-lhe a maioria absoluta que sobra a Sócrates que conta, ainda por cima, com um PS empobrecido e sem debate ideológico. Soares, que é esperto, viu isso melhor do que ninguém e percebeu que é inútil remar contra o primeiro-ministro, a quem já chamou, em tempos, "o pior do guterrismo". Manuela Ferreira Leite, como não quer erguer a bandeira do populismo ou do oportunismo, apenas pode aguardar, enquanto o país, moralmente, empobrece.

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Notícia de Frankfurt: o livro inédito de Vladimir Nabokov, 'Laura', será publicado em Portugal pela Teorema. Carlos Veiga Ferreira, o editor, ganhou mesmo (do agente Andrew Wylie) uma cópia do manuscrito e é um homem feliz. Pudera.

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FRASES

"Sócrates nem precisa de abrir a boca. Os seus ventríloquos estão por todo o lado." João Gonçalves, no blogue Portugal dos Pequeninos.

"Só faz falta quem cá está, também no meu caso." Cristiano Ronaldo, ontem no CM.

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outubro 15, 2008

Blog # 203

Vivemos em turbilhão. Depois da "onda de criminalidade violenta" durante o Verão, veio a crise financeira no Outono, com a questão dos combustíveis pelo meio. Não sabemos o que nos reserva o Inverno (Steinbeck escreveu "O Inverno do Nosso Descontentamento"), mas de uma coisa podemos estar certos: dificilmente iremos encarar o futuro com a mesma leviandade. As crises obrigam-nos a repensar o modo de vida e a forma como lidamos com as coisas banais: o preço da bica, as compras de Natal, a roupa do ano passado, os gestos menores do dia-a-dia. Há quem se lamente de que, assim, ficamos mais conservadores. Se for verdade, é uma vantagem. Os 'optimistas' têm mais desilusões; os 'pessimistas' estão mais preparados para os dias que aí vêm. É uma verdadeira lição de teoria política.

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O belo 'O Fantasma Sai de Cena', de Philip Roth, sai em Novembro, na Dom Quixote – mas eu apostaria em que uma das boas novidades da editora é o brilhante 'Um Homem Muito Procurado', de John Le Carré, já nos prelos para a mesma data.

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FRASES

"Mas será que alguma vez houve dinheiro para viver assim?" Helena Matos, no blogue Blasfémias.

"Baleou-me no pé e depois de eu lhe ter dado 50 euros arrancou-me um fio de ouro." Reinaldo Silva, 52 anos, ontem no CM.

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outubro 14, 2008

Blog # 202

Aterro em Frankfurt para o espectáculo habitual: a Feira do Livro começa hoje com os seus habituais doze quilómetros de livros, stands, bisbilhotices, negócios, segredos, vaidades e reencontros. A maior feira do livro do mundo abre as suas portas a meio (ou no princípio) de uma crise económica que afecta todos os países representados nos seus corredores – mas o sonho não pára: o dos livros. Milhares de novidades aguardam milhares de visitantes. A cidade que conheceu Goethe e Marcuse continua a ser o epicentro de uma actividade cada vez mais em desuso (fazer livros para alguém ler) mas que dá sentido à nossa vida (amanhã, Paulo Coelho dá uma festa para assinalar 100 milhões de livros vendidos). Frankfurt reabilita uma parte desses sonhos, prolongando a vida da civilização.

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Apenas jogada comercial ou apenas material de propaganda? Em Frankfurt foi ontem anunciado que o novo livro de Luís Miguel Rocha já tem os direitos vendidos para Itália e para os EUA (onde 'O Último Papa' foi sucesso). Não para Portugal.

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FRASES

"Ninguém se preocupa a sério com Portugal." Virgílio Castelo, actor e autor de um romance, ontem no CM.

"Que autoridade tem a CML para vir cobrar insignificâncias aos seus munícipes?" Miguel Morgado, no blogue O Cachimbo de Magritte.

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outubro 13, 2008

Blog # 201

Enquanto os EUA se iniciam nos mistérios da nacionalização da banca (uma perversidade que vai sair cara), aqui os tempos não estão para minudências. O presidente da Associação de Bancos, por exemplo, diz que a abundância acabou, sem que ninguém lhe tenha chamado astronauta, porque abundância, propriamente, não tem havido. A abundância está sempre a meio caminho da crise num mundo em que se pensa que o crescimento é infinito e que o crédito é o outro nome da riqueza. As pessoas querem uma vida mais fácil. Tem sido, mas para os gastadores, para as companhias de crédito e para os que ganham dinheiro rápido – as empresas e as pessoas têm de trabalhar no duro para sobreviver. É estranho, por isso, que sejam empresas e pessoas a pagar os desvarios de quem esbanjou quase tudo.

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Nostálgicos, historiadores, sociólgos, românticos: está aí 'Foi Você Que Pediu uma História da Publicidade?', de Luís Trindade (Tinta da China) – uma viagem pelos maravilhosos anúncios da imprensa portuguesa do século passado. Maravilhosos, note bem.

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FRASES

"Ora bem. Portugal pode não ser viável." José Miguel Júdice, ontem no CM.

"Tenho uma relação anual muito forte (quase matrimonial) com o Fisco." G.A.F., no blogue O Vermelho e o Negro.

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outubro 12, 2008

O segredo do Mar

Não sei se conhecem Amyr Klink. A primeira vez que vi o seu rosto elegante, aquela sombra de nostalgia a pairar, foi num documentário exibido na televisão brasileira (incluído na série Documenta Brasil), um momento extraordinário de revelação – de Paraty, onde vive, à Antárctida ou ao Pólo Norte, Amyr Klink é mais do que um navegador que procura percorrer distâncias: ele leva-nos a imaginar o que esse percurso significa. Com o seu navio Paraty preso num banco antárctico, Klink esteve cerca de um ano naquelas regiões, aguardando o tempo certo de regressar a casa. Pensei muitas vezes nessa temporada no Inferno – até que a visão dos monstros gelados do Sul me pareceram sublimes, uma espécie de convite à reflexão, ao abandono, ao silêncio puro e absoluto, apenas cortado pelos ventos que sopram durante a noite ou às horas escuras do dia.

No entanto, embora essas viagens extremas sejam muito fascinantes e tenham cada vez mais apeciadores, a minha preferência vai para um pequeno livro, Cem Dias Entre Céu e Mar, onde relata a experiência magnífica que foi atravessar o Atlântico Sul num barco a remos, entre a Namíbia (Lüderitz) e o Brasil (Salvador, na Bahia). Nunca percebi o que leva um ser humano a atrever-se a esse tipo de aventuras, mas depreendo que haja muito mais do que a própria aventura em si mesma, muito mais do que a resposta a um desafio puramente físico – no limite do «desporto». O livro de Klink é de uma simplicidade comovente, limitando-se a narrar os episódios centrais da viagem e dos seus preparativos; mas ao lermos a descrição das noites do Atlântico, da chegada miraculosa (ou salvadora, pelo menos) às águas geladas de Santa Helena (a ilha onde Napoleão cumpriu o seu exílio, um pouco acima de Tristão da Cunha – o meu arquipélago de eleição), das conversas via rádio com comandantes de navios que enfrentam a solidão dos mares, ou dos encontros com uma baleia certamente descendente de Moby Dick, somos levados para uma dimensão mais profunda, tão escura como a absoluta escuridão daa águas, tão densa como as neblinas que atravessam ou separam continentes. Mas, sobretudo, tão surpreendente como as narrações dos viajantes antigos, de quando não havia sistemas de comunicação de satélites.

Calhou, depois de ter lido Cem Dias Entre Mar e Céu, lembrar-me do meu próprio percurso pelo litoral brasileiro – afinal, eu tinha vivido cerca de dois anos a um passo da Praia da Espera, onde, em Setembro de 1984, Amyr Klink regressou dessa sua viagem que o trouxe da Namíbia aos trópicos da América. É uma praia relativamente tranquila, de águas azuis, em Camaçari – onde Klink dividiu duas sardinhas com um pescador que não sabia onde era essa «praia» chamada «África» (de onde tinha regressado o seu inesperado conviva).

Ainda hoje, passado muito tempo da leitura dos livros de Amyr Klink, recordo as imagens de territórios que ele atravessou, para lá de Ushuaia e do Canal Beagle, para lá do Cabo Hornos, esse promontório quase flutuante onde se marca o abraço do Atlântico e do Pacífico diante do negrume da Antárctida, ao largo e à vista.

Aventureiros como Klink eram, nos anos oitenta e noventa, os últimos viajantes solitários do nosso tempo – eles conheceram os limites, partilharam os seus medos com o silêncio dos mares, encontraram o seu destino entre o destino das coisas, e compreenderam que viajar significava, sempre, conhecer. Conhecer um aroma, uma impressão ligeira, uma luz, um ruído. Aprendi com as suas viagens (e com as narrativas de Jack London, ou Melville, ou Coloane) que o segredo do mar não é o seu retrato como uma sombra de cartolina. É, antes, o demónio da aventura que nunca nos larga.

in Outro Hemisfério – Revista Volta ao Mundo – Outubro 2008

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outubro 11, 2008

Recordações do Oriente

Deixo para trás Timor, o avião sobrevoa o mar, que é azul, brilhante, tranquilo e plácido com o seu brilho de prata. Se os mares do Sul existem, é aqui – a duas horas de voo sobre o Grande Recife de Coral. Luís Cardoso, escritor timorense (recomendo vivamente o seu romance mais recente, Requiem para o Navegador Solitário) diz que o Grande Recife é uma das provas da existência de Deus – com aquela grandeza ultramarina. Imagino-o a esta distância, porque, visto do céu, sempre me pareceu uma peça de filigrana subaquática, iluminada por todas as cores. Deixo para trás Timor, as varandas das florestas de Ermera, o verde de Aileu, a estrada que me desvendara a madrugada de Lospalos, as algas magníficas de Baucau, a neblina das montanhas. Quinze dias antes o avião pousara em Díli e eu saíra a custo, a meio de uma convalescença que a viagem entre Amesterdão e Singapura interrompera – mas aquela humidade do Oriente obrigara-me a retomar a vida inteira. O perfume dos cafezais. As ravinas inclinadas sobre o interior da terra. As árvores, grandiosas.

Ainda quero ir a Flores, a ilha mágica e desconhecida, um território indonésio perdido no meio de outras ilhas mágicas e desconhecidas – a nós, portugueses, não nos calhou tudo, felizmente, porque teríamos estragado muito, ou esquecido mais. Mas, antes de pensar nisso, o avião, com três horas de voo, aterra em Bali. Tomo medicamentos de tantas em tantas horas, e a fila dos passaportes é imensa, o atendimento é lento; acabam de chegar os voos do Ocidente com turistas que, daí a pouco, encherão as ruas de Denpasar, os restaurantes de Legian, Kuta e Tanah Lot, as praias que limitam a capital. Só tomo os comprimidos quando consigo um táxi numa fila ordenada do aeroporto. E então é o fio do equador que toma conta de tudo: do céu, dos perfumes das ruas (aquele cheiro de sambal e kecap, de ervas aromáticas, de arroz frito, de nasi goreng). Árvores em todo o lado, céu rosado do anoitecer. Quando chego ao hotel adormeço logo e durmo (há um resto de febre que vem de Díli) por dez horas. Até hoje, nunca mais consegui.

Nos dias seguintes, a ilha foi-se revelando aos poucos. Não tendo optado pela praia, perdi-me por estradas das montanhas, entre Tabanan e Ubud, Bangli e Tirtagangga, embora a ideia fosse visitar Singaraja, a cidade no outro extremo do território, a primeira capital da ilha. Templos iluminados pela luz tranquila da tarde, ao lusco-fusco. Restaurantes perdidos em estradas secundárias, com toalhas de plástico, onde se comem os melhores arrozes – temperados ou apenas de companhia –, bakso (a sopa das sopas), bubur injin, as cervejas locais, leves, apetecidas. Passados todos estes anos, recordo Bali como «a ilha da natureza», o jardim antigo onde as pessoas se sentam diante das árvores apenas com o propósito de as admirar. Esse respeito comove-me. E a delizadeza dos balineses.

Provavelmente, não vem agora ao caso, a minha vida podia ter mudado em Bali. Nunca antes fora tocado pelo vento do Índico daquela forma. Em 1585 os portugueses teriam chegado à ilha – sim, antes dos holandeses – ao ponto que é hoje a península de Bukkit, e imagino a aparição, diante dos navegadores, daquele corpo imenso de terra arborizada, coroado pelas montanhas e pelo pico do Agung, ao fundo, rodeado de nuvens. Tenho pena quando penso em Bali. Guardo uma ternura disparatada por Bali, pelos seus bares de madeira e música suave, até pelas estradas escondidas rente aos lagos. Sonho que um dia voltarei às sombras do templo de Besakih e àquele vento do Índico.

in Outro Hemisfério – Revista Volta ao Mundo – Agosto 2008

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outubro 10, 2008

Blog # 200

Havia muitas apostas em Le Clézio para o Nobel deste ano – sobretudo depois de um pateta, o secretário da Academia Sueca, ter vindo declarar que os EUA não faziam parte do mundo da literatura, o que significa dizer que Philip Roth, Thomas Pynchon ou Salinger são matéria de segunda linha. Não são. Mas o que interessa é isto: o Nobel foi para um autor nómada, um geógrafo da literatura, que tanto escreveu sobre o deserto como sobre a Índia, a África – os as ilhas que nunca esqueceu, as Maurícias, em nome de personagens que vivem mundos difíceis ou cruéis. Vive agora no Novo México como Yourcenar vivia numa ilha americana. É um daqueles autores que não se socorre de bandeiras políticas quando não tem nada para dizer – e essa será a sua principal vantagem sobre os flibusteiros.

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Para quem nunca esqueceu 'O Céu que nos Protege', de Paul Bowles, está aí 'Por Cima do Mundo' (edição Assírio e Alvim) – o cenário é a América Central. A Assírio reeditou também Mishima e 'O Marinheiro que Perdeu as Graças do Mar'.

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FRASES

"Vou retirar a tatuagem em breve. Ronaldo é muito bom na cama [mas] imaturo e cobarde." Nereida Gallardo, que há dois meses namorava com Cristiano Ronaldo, ontem no CM.

"Não provoquei a crise, pago as contas e não percebo porque raio tenho que pagar a irresponsabilidade alheia." Manuel Jorge Marmelo, no blogue Teatro Anatómico.

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outubro 09, 2008

Blog # 199

A pátria discute empenhadamente o fim do capitalismo. Dá gosto assistir ao debate num País relativamente pelintra onde os grandes empresários são acusados de viverem "encostados ao Estado" e onde os investimentos globais têm a marca de "interesse nacional" ou de compromisso Estado-a-Estado.

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Os intelectuais de serviço a tão interessante disputa correm, com emprego protegido, para não serem ultrapassados pelos acontecimentos – e tomam partido por Obama ou McCain da mesma forma que decidem o futuro do que chamam "neoliberalismo", entusiasmados com a crise geral do capitalismo. Essa corrida impede-os de prestar atenção ao que se passa em casa, na sua rua, nas vidas desinteressantes dos portugueses para quem as contas de mil milhões de euros são sempre irreais e abstractas.

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outubro 08, 2008

Blog # 198

Realizou-se um congresso na Gulbenkian – sobre a obra de Eduardo Lourenço. As televisões aproveitaram e tentaram transformar Lourenço num ícone pop, coisa que não incomoda ninguém, nem incomoda o próprio. Antes fazer isso com o autor de 'O Esplendor do Caos' do que com um bando de patetas cuja utilidade fica sempre por demonstrar. Lourenço ensinou Portugal a pensar para lá do imediato; aos 85 anos as suas perguntas são práticas, justas e preocupantes. Na verdade, é o nosso maior pensador; um homem de esquerda que se situa muito para lá dos estilhaços da esquerda caseira; um homem da literatura que interroga o sentido que a vida tem. E, no fundo, será sempre um estrangeiro dentro de casa, da nossa e sua casa. A sua voz não se perde no meio do ruído. Não é fácil ser como ele.

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Sai em Novembro 'Como o Soldado Repara o Gramofone', de Sasa Stanisic – um romance fascinante escrito por um jovem sérvio que não tem medo da morte e que recorda a guerra como um ruído de fundo. Tem sido best-seller por toda a Europa.

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FRASES

"O Estado não deixará de fazer tudo aquilo que deve." José Sócrates, ontem no CM.

"Hoje o capitalismo morreu e o Benfica empatou com o Leixões. Maldito Benfica." Rodrigo Moita de Deus, no blogue 31 da Armada.

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outubro 07, 2008

Blog # 197

O tempo de que Manuela Ferreira Leite dispunha no pico do Verão está agora a esgotar-se. E, infelizmente, esgota-se sem brilho, sem glória e sem esclarecer o eleitorado. O que é grave – porque se aproximam dias de crise e a única voz que se ouve acima do ruído é a do presidente da República, que não fará favores à oposição, e a quem Sócrates há-de colar-se para conquistar o "centro" dos novos tempos. A líder do PSD há-de ter as suas razões para economizar intervenções – algumas delas são justas, sensatas e até exemplos de boa política. Mas o que transparece é isto: no meio das crises, este silêncio pode significar que Manuela Ferreira Leite não tem nada para oferecer, nem um pouco de demagogia. Se for assim, é ainda mais grave: a palavra e as oportunidades são o sal da política.

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Releio 'A Vida Eterna', de Fernando Savater (Dom Quixote) e compreendo a sua urgência: um ser humano que não discute a sua 'condição sobrenatural' não merece pensar na eternidade. É um livro que nos autoriza a falar com o invisível.

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FRASES

"O que é vivido pelos cidadãos não pode ser iludido pelos agentes políticos." Cavaco Silva, ontem no CM.

"Não fui convidado para emitir a minha opinião sobre Educação e essas merdas assim." Maradona, no blogue A Causa Foi Modificada.

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outubro 06, 2008

Blog # 196

A circunstância, dizem alguns, não foi muito apropriada para o presidente da República lembrar que há empresários que dependem "do encosto ao Estado" – sobretudo quando o "grande empresariado" vive de obras públicas e de equilíbrios monetários decididos pelo Estado. Mas os seus reparos são corajosos numa altura em que o Estado não tem dinheiro para as grandes obras públicas do regime (que viriam diminuir o desemprego e ocupar as grandes empresas). O presidente, no fundo, apenas lembrou que há portugueses para quem o dinheiro é caro e que vivem do seu trabalho e não da "permuta de favores com o poder político". Pelo aspecto da coisa, a alta finança lusitana, empertigada, torceu o nariz porque, como de costume, o seu dinheiro invisível depende desses compromissos políticos.

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Dinis Machado foi um dos últimos escritores a nascer fora da academia. A sua humildade foi-lhe injusta, mas escreveu o grande livro do pós-revolução, 'O Que Diz Molero', romance de geração. Talvez por isso seja tão lido pelos mais novos.

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FRASES

"O mundo é um cemitério de regimes que se julgaram eternos." Paulo Cunha Porto, no blogue Corta-Fitas.

"Os empresários também [...] estão também muito dependentes do Estado." Daniel Proença de Carvalho, ontem no CM.

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outubro 05, 2008

Livros de nossa casa

Programa de Francisco José Viegas no cabo revela obras marcantes para leitores conhecidos.

Depois de "Livro aberto", Francisco José Viegas regressa à grelha da RTPN com um formato intitulado "Guarda livros". É, pois, de obras literárias que vai tratar, mas, desta vez, entra na biblioteca de diversas personalidades.

Será num registo mais intimista que, a partir do próximo domingo, semanalmente, pelas 23 horas, Francisco José Viegas voltará ao pequeno ecrã. Como não poderia deixar de ser, os livros são uma vez mais protagonistas, mas segundo uma lógica invertida àquela a que nos tem vindo a habituar.

"Guarda livros" privilegia não os autores ou as obras recentemente publicadas, mas antes livros que marcaram a vida de várias figuras portuguesas. Desta feita, as mesmas não só abrirão a porta de suas casas, como irão desvelar o universo literário que povoa o seu imaginário e se consubstancia nas prateleiras de uma biblioteca pessoal.

"O convidado fala sobre os seus livros, sobre a sua memória desses livros, como formou a sua biblioteca, como a arruma ou desarruma. A prioridade vai para os livros de nossa casa", elucida Francisco José Viegas. O apresentador esclarece que, neste caso "será apenas o pivot", uma vez que a ideia do programa germinou de uma proposta de José Alberto Lemos, director da RTPN, acolhida pela produtora e originalmente concebida por José Fanha.

Pese embora Viegas preferisse "fazer um programa com convidados e debates", deixou-se cativar por "Guarda livros", que no fundo mostra "que as pessoas não podem viver sem livros, que não imaginam a sua vida sem eles", enaltece. O grande propósito do formato é "divulgar a paixão pelo livro" personalizada nos convidados, até porque "o exemplo de grandes leitores é muito mais eficaz do que os discursos patetas sobre a 'leitura como um acto de cidadania'", refere.

Para o apresentador, "a leitura não tem nada a ver com cidadania. Cidadania é votar, participar na vida pública. Ler e ter livros é uma actividade puramente individual, privada, que tanto pode abrir-nos a porta para a felicidade como para a desgraça", sublinha.

"Guarda livros" pautar-se-á pela diversidade de convidados. António-Pedro Vasconcelos, António Borges Coelho, Maria Filomena Mónica, Marcello Mathias, José Miguel Júdice, Rúben de Carvalho, Vasco Graça Moura, Lauro António ou Urbano Tavares Rodrigues são apenas alguns dos exemplos apontados. Cerca de 15 programas estão já gravados, todos eles "em casa das pessoas, junto dos seus livros, das suas estantes, das suas memórias".

Na senda de "Guarda livros" está também, à sua maneira, prestar serviço público. De acordo com Francisco José Viegas, "mostrar pessoas que lêem e amam os livros dá um exemplo para os outros" e acrescenta: "Provam como a sua paixão pode ser deliciosa e fatal e partilham-na connosco. É muito raro isso acontecer num país em que as elites se demitiram de dar bons exemplos", assinala.

Interrogado se ainda se lê pouco no nosso país, responde: "Lê- -se o normal para um país da nossa dimensão, mas não se lê bem". Que medidas deveriam, então, ser implementadas para se cultivar o hábito da leitura? "A escola devia ter um papel mais formativo nessa área como espaço de socialização que é, e devíamos prestar mais atenção aos clássicos. São eles a garantia do prolongamento da nossa identidade", remata.

in Jornal de Notícias - 3 Setembro 2008

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outubro 03, 2008

Blog # 195

Quem brinca com o sexo ou se diverte muito ou fica desacreditado. Alberto Martins e a bancada parlamentar do PS correm o risco de ficarem desacreditados a propósito das disciplina de voto no debate e votação dos projectos sobre casamentos homossexuais. O assunto devia ser consensual depois de se saber que José Sócrates e a larga maioria de dirigentes socialistas são favoráveis à ideia e a acham muito de esquerda. Mas compreende-se: os projectos são do Bloco e dos Verdes, e o PS não está para ir atrás dos outros. O argumento usado é delirante: o PS não inscreveu a matéria no seu programa eleitoral. Se fôssemos contabilizar as discrepâncias entre as promessas eleitorais e a realidade, o PS coraria de vergonha (impostos, por exemplo). Mas, enfim, é uma mariquice, dizem eles.

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Depois de "Os Livros Que Não Escrevi", a Gradiva publica "Anno Domini", de George Steiner – uma história sobre a II Guerra, incursão ficcional e romanesca de Steiner, que surpreenderá muitos leitores. Tradução de Miguel Serras Pereira.

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FRASES

"Importante [na história das casas da CML] é a queda de alguns moralões de pés de barro." No blogue O Jansenista.

"Dispararam trinta tiros contra os prédios e as pessoas." Moradores do Bairro do Cerco, Porto, sobre 'Fábio Gordo' e 'Ni', ontem, no CM.

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outubro 02, 2008

Blog # 194

"Os municípios do interior estão despovoados de massa crítica, investimento e receitas próprias", diz António Edmundo, presidente da Câmara de Figueira de Castelo Rodrigo, que decidiu (e bem) tomar medidas para fixar jovens casais no seu concelho. É uma tarefa do outro mundo, tendo em conta as armas de que dispõe a câmara local: prémios de 500 a 750 euros para cada criança que nasça na vila ou para cada casal que decida fixar-se no interior da barreira de xisto que delimita o concelho. Com essa quantia, António Edmundo luta heroicamente contra a força do destino, que é animada pela inércia e pela concorrência desleal das cidades do litoral. Todos gostávamos de ter uma palavra de esperança para Figueira de Castelo Rodrigo; mas, sinceramente, os tempos estão difíceis. E caros.

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A FNAC acabou com o desconto de 10% sobre o preço de capa na sua área de livraria; a partir de agora, descontos só com "cartão de cliente". Desaparece, assim, um dos motivos de atracção dos seus espaços, a promessa de "preço FNAC".

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FRASES

"Dizia que a matava e matou-a mesmo." Hélder Marques, irmão de Nita, assassinada pelo ex-marido, ontem no CM.

"Quando o Estado tem ao seu dispor todas as armas, incluindo a falta de vergonha, quem se lixa é o contribuinte." H. Franco no blogue Geração Rasca.

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outubro 01, 2008

Blog # 193

De repente, à esquerda e à direita surge uma onda de solidariedade com "as vítimas" do desastre financeiro que está à vista. Os mais "solidários" voltam-se contra o Congresso Americano que desobedeceu aos chefes partidários e achou que não devia aprovar o plano de salvamento que lhes era proposto lá de cima. Os "solidários" acham que é egoísmo não querer dar uns dólares ao vizinho. O problema é que não se trata de "uns dólares" – são, pelo menos, 2500 por cada cidadão americano. E não é ao vizinho – mas sim aos bancos que usaram e abusaram do risco. Não é preciso perceber de economia para saber que são os contribuintes que vão pagar a despesa; por isso, a falência desses bancos não me parece mal. Se é preciso aplicar o dinheiro dos contribuintes, há muito por onde começar.

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Ninguém diria que o autor de 'As Mil Luzes de Nova Iorque', Jay McInerney, iria redimir-se – mas há motivos para optimismo o seu novo livro é 'Um Hedonista na Adega' (Casa das Letras), onde McInerney fala dos melhores vinhos do mundo.

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FRASES

"Há organizações que deixaram o tráfico de droga para se dedicarem à contrafacção de medicamentos." Vasco Maria, presidente do Infarmed, ontem no CM.

"O Rochemback e eu somos parecidos pelo facto de engordarmos de uma forma desmoralizante." Sérgio Gouveia, no blogue A Dieta de Rochemback.

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