novembro 30, 2010

Blog # 747

Ai dos artistas quando chegam ao Ministério da Cultura. Ontem, numa entrevista ao ‘Público’, o diretor-geral das Artes, João Aidos, nomeado em Julho pela Ministra da Cultura, diz que o primeiro-ministro tem “falta de estratégia política” e manifesta muitas dúvidas sobre a forma como o governo orienta a sua “política cultural”. Nada que não se soubesse, mesmo sem lá estar antes. Mas, estando – há um dever de solidariedade e, até, de silêncio. Ou, então, dado o panorama ser tão dramático, dizer o que tem a dizer, mas não esperar grandes festejos. Não pode é dizer que “se saísse [do cargo], era um descalabro”. Não era. Descalabro é o que, de uma maneira ou outra, está desenhado no organograma e na matriz do ministério. Mas isso é uma coisa. Outra, é ser franco-atirador.

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Hernán Rivera Letelier é um notável narrador chileno. A Ulisseia acaba de publicar ‘Os Comboios Vão para o Purgatório’: o cenário, deslumbrante, é o do deserto de Atacama – e só isso bastava para o recomendar. Mas há muito mais.

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FRASES

"Os espertalhões que sabem colocar-se ao lado de quem vai ganhar, não terão guarida." Pedro Passos Coelho, ontem, no CM.

"Uma pessoa de esquerda pode ser de esquerda. Uma pessoa de direita não pode ser de direita." Henrique Raposo, no blogue Clube das Repúblicas Mortas.

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novembro 29, 2010

Blog # 746

Fala-se muito em desperdício. Sejamos, então, “populistas” – e relembremos como as televisões cortam “na cultura” e como “a cultura” tem sido cortada do orçamento (ao ponto de se acabar com a vida útil da Direção-Geral do Livro). Muitos dos gastos “com a cultura” precisam de ser reanalisados, claro, e ser mais transparente a sua atribuição. Mas que o Estado português gaste mais de cinco milhões de euros em blindados para a PSP – e que eles não cheguem – parece um excesso em temporada de crise. Ser “populista” às vezes traz vantagens. Por exemplo: quantos milhões já foram gastos em empresas públicas inúteis e inviáveis ou com operações de propaganda? Muitos. Quantos foram utilizados no apoio à indústria do livro, a única lucrativa das “indústrias culturais”? Nenhum.

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“Viva México”, de Alexandra Lucas Coelho é o novo livro da belíssima coleção de viagens da Tinta da China, organizada por Carlos Vaz Marques. Três semanas no “hemisfério mexicano” e um relato que não se esquece tão cedo.

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FRASES

"Falamos da vinda do FMI como se fala da última contratação para o Benfica." João Pereira Coutinho, ontem, no CM.

"Fiz, nomeadamente, greve. Também tenho arrumado livros e feito malha, muita malha." Dora, no blogue Capricorniana.

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novembro 28, 2010

Antes do clássico

1. Este fim de semana, o clássico Sporting-FC Porto marca a jornada e pode também marcar o campeonato. Cada uma das equipas quer ganhar por motivos diferentes, mas o que está em jogo é mais do que um aparente confronto entre as duas equipas. O Sporting tem mais a perder (porque se perder, de facto, arrastar-se-á na tabela) do que o FC Porto, que conta com uma confortável margem de manobra. Mas seria excelente que os dois grandes clubes dessem uma lição de civilidade e o jogo não fosse precedido de patetices de nenhum dos lados.

Por isso o presidente do Sporting fez bem em vir desdramatizar o «não-episódio João Moutinho», que ele próprio criou no calor do Verão, quando o Sporting ainda tinha um longo caminho a percorrer. Ao fazê-lo reparou um deslize, mas reconheceu o erro, que já lá vai. Quanto ao jogo, que seja bom.

2. A UEFA instaurou um processo a José Mourinho e a quatro jogadores do Real Madrid «por se terem feito expulsar» no jogo da Champions com o Ajax. Juridicamente, não tem ponta por onde se lhe pegue; «moralmente», a UEFA tem um imbróglio às portas. Qual o critério que prevalecerá? Se é o jurídico, mais vale não começar; se é o «ético», é bom que a UEFA pense em justificar a opção. A ideia de processar também os jogadores do Real (e logo quatro, para mostrar que está atenta) é, de resto, uma cortina de fumo – porque o objectivo é castigar José Mourinho para fazer saber que os gerontes da confederação não toleram espertezas aos mais rebeldes. O que seria de nós sem eles, os moralizadores da UEFA?

3. Na magnífica vitória do Sporting de Braga, na terça-feira, o segundo golo de Matheus é uma pequena obra de arte – torcendo a defesa do Arsenal, deslizando, recuando e rematando à antiga portuguesa. Nenhum dos golos do bravo Hapoel de Telavive se lhe pode comparar. Desculpem, mas não resisti.

in A Bola - 28 Novembro 2010

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novembro 26, 2010

Blog # 745

Danny Trejo só podia ser protagonista de um filme de categoria B – ou C. Eternamente relegado para papéis secundários e de última categoria, é ele, agora, o protagonista de ‘Machete’, de Robert Rodriguez. No filme aparecem também Robert De Niro, Steven Segal, Jessica Alba e Lindsay Lohan. Não interessa – o centro, o motor, a razão de ser está em Danny Trejo. Quem o viu em ‘Runaway Train’ ou em ‘Con Air’ não sabia que Trejo esteve mais de 10 anos preso – apenas detectou uma tendência natural para os papéis de vilão, o mau da fita. Em ‘Machete’, que agora estreia, Danny Trejo tem a sua oportunidade e aproveita-a: é realmente mau num filme cuja violência lhe abre as portas da comédia. Arrisca-se a ser um actor de culto, no pódio com Charles Bronson. Não engana ninguém.

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Já há nomeações para o Bad Sex In Fiction (as piores cenas de sexo em romances). O mais sério candidato é ‘Freedom’, de Jonathan Franzen (em 2011 em Portugal). Em 2010 a pior sexo era o de ‘As Benevolentes’, de Jonathan Littell.

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FRASES

"Portugal, berço inesgotável de pategos, rejubila quando encontra um professor Silva em Oxford." Luís M. Jorge, no blogue Vida Breve.

"No Estado, feito de fundações, institutos e empresas, mandam os ‘boys’ dos dois partidos." Eduardo Dâmaso, ontem, no CM.

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novembro 25, 2010

Blog # 744

Um protesto cercou, no Porto, o Teatro Nacional de São João. A tutela, o Ministério da Cultura, decidiu integrá-lo no Opart, juntando-o à Companhia Nacional de Bailado, ao São Carlos e ao Teatro D. Maria. O problema não são as decisões sobre os organismos tutelares – são os processos morosos e indecisos que, entre avanços e recuos, deixam a contabilidade infectada e a gestão defeituosa. Cada novo responsável político quer alterar (e altera) o panorama dos teatros, dos museus, dos institutos ou das secretarias, mesmo que não se vejam vantagens nas mudanças. Não se percebeu ainda, entre nós, que uma das virtudes da governação é a de não tomar decisões revolucionárias e controversas. Sobretudo na área da cultura, onde convém que a poeira assente com tranquilidade.

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Leia-se a biografia de Henrique Galvão, por Pedro Jorge Castro, ‘O Inimigo N.º 1 de Salazar’ (Esfera dos Livros). Galvão aparece na capa como uma estrela pop. E, de certa maneira, é esse o segredo da sua figura de aventureiro.

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FRASES

"O Emmy obtido pela novela “Meu Amor” é a demonstração de que a ousadia compensa." José Eduardo Moniz, ontem, no CM.

"Qualquer barracão com meia dúzia de cadeiras virou universidade." João Gonçalves, no blogue Portugal dos Pequeninos.

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novembro 24, 2010

Blog # 743

Os seus livros não cabem nas categorias muito bem definidas dos catálogos e Gonçalo M. Tavares, creio eu, só dificilmente será um ‘best-seller’, embora seja um dos mais premiados autores portugueses contemporâneos. Anteontem obteve o do melhor romance estrangeiro publicado em França (para ‘Aprender a Rezar na Era da Técnica’). O seu nome está envolvido numa espécie de aura que tanto invoca a ‘ficção’ como a ‘teoria’. Compreende-se. Gonçalo M. Tavares é um caso único na nossa literatura atual: escolheu um modo de escrever, um tom, um estilo, uma presença, uma voz. Trabalhou muito e intensamente, e recomeçou nos momentos difíceis. É reconhecido pela sua originalidade – a mesma que marca o seu novo e volumoso livro, ‘Uma Viagem à Índia’, romance em verso. Parabéns.

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São quase 700 páginas para entender o poder, o destino, a obra e a solidão de 17 mulheres que preencheram 400 anos de história portuguesa – é o tema de ‘Rainhas Medievais de Portugal’, de Ana Rodrigues Oliveira (Esfera dos Livros).

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FRASES

"Estou mais velha e cansada." Mariza. Ontem, no CM.

"A acumulação de prémios tende a dizer muito pouco sobre a qualidade do premiado." No blogue Ouriquense.

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novembro 23, 2010

Blog # 742

Se nas escolas portuguesas se estudasse música, seriam amanhã assinalados os 360 anos que nos separam da morte de Frei Manuel Cardoso (1566-1650), um talento extraordinário na história da nossa cultura. A sua missa de Requiem (há duas versões a reter, a da Schola Cantorum de Oxford, e a dos Tallis Scholars – alem de um conjunto de obras polifónicas pelo Ars Nova Ensemble) é um relâmpago que ilumina todo o XVII, na companhia, por exemplo, das obras de Duarte Lobo, outro mestre da época. Manuel Cardoso é o derradeiro profeta de uma melancolia conservadora e anti-europeia que depois conheceria o brilho do barroco e do maneirismo posteriores (que marcariam Carlos Seixas); mas é sobretudo um altíssimo nome português que a ignorância atual maltrata. Ouçamo-lo um pouco.

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Uma escrita deliciosa e culta: a de ‘O Quinto da Discórdia’, de Robertson Davies, um dos clássicos americanos do século XX e um mestre na arte de contar uma história (edição Ahab) sem parecer que se limita a contar uma história.

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FRASES

"Não há remodelações que resolvam o que só o povo pode resolver. É uma questão de tempo." Marques Mendes, ontem, no CM.

"Gosto tanto, que não leio tudo de uma vez. Vou lendo, devagar, para prolongar o efeito." Henrique Raposo, no blogue Clube das Repúblicas Mortas.

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novembro 22, 2010

Blog # 741

A partir de amanhã, o Algarve vai ter Shakespeare (‘A Tempestade’) nas escolas do 1.º Ciclo – a Companhia de Teatro do Algarve (CTA) vai andar de terra em terra a mostrar às crianças o cenário fantástico da ilha de Próspero. Não menosprezem. Quando os hierofantes institucionais da cultura falam em “criação de novos públicos” esquecem-se de que estes nascem na escola; o Ministério da Educação, transformado em repartição administrativa, tem vindo a encarregar-se, aliás, de destruir a educação artística e humanística. Por isso, esta peregrinação do CTA devia ser multiplicada, se possível com mais Shakespeare, o génio dos génios. Se há orçamento do Ministério da Cultura que nunca devia ser cortado é precisamente este: é como pão para a alma, um verdadeiro serviço público.

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Saiu ‘Histórias Daqui e Dali’, do chileno Luis Sepúlveda (Porto Editora): à falta de uma história de grande fôlego, ‘Lucho’ elege pequenos fragmentos de vida e de território como elementos de sentido para a sua vida e a sua obra.

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FRASES

"Faz o que queres fazer antes de o quereres. Depois é demasiado tarde." Luís Serpa, no blogue Don Vivo.

"Estas fotografias representam tudo o que é contrário ao espírito do casamento." He Lin, da associação de fotógrafos chineses, que proibiu os recém-casados de se fotografarem sem roupa. Ontem, no CM.

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novembro 20, 2010

Chicuelina & revolera

Gosto muito do Moreirense porque tem o estádio português com o melhor restaurante nas proximidades, quase acoplado (o São Gião, príncipe da gastronomia portuguesa). Mas o FC Porto tem de cumprir a sua missão e seguir em frente. Não se enganem na digestão. É na baliza.

2. A selecção jogou como há muito tempo não a via, a trucidar, empurrada para o ataque (acho que nunca a vi fazer isso), o que significa que Paulo Bento pode ter conquistado o coração dos jogadores no balneário – e o dos portugueses através da televisão. Bento merece-o. Pelo seu estilo. Por se tratar de um ajuste de contas com o futebolinho português, que ora não gosta da sua marrafa, ora não aprecia a forma como pede aos jogadores para serem guerreiros. Paulo Bento teve três testes mas o mais decisivo vem agora, depois do festival de toureio espanhol, uma lide de primeira categoria com quatro mudanças de tércio e uma chicuelina seguida de revolera, dançante e patriótica. Se a selecção conseguir manter o ritmo e servir espectáculo na arena, declaro desde já que a acompanharei na fase final.

3. Já agora, Espanha. A Comissão contra a Violência, o Racismo, a Xenofobia e a Intolerância no Desporto (existe uma outra, divertidíssima, que pretende «normalizar os horários» e acabar com a sesta, e mesmo um «observatório» que zela para que as crianças não tenham brincadeiras sexistas e machistas nos recreios da escolas) proibiria Antonín Panenka de marcar penáltis daquela maneira, humilhando os guarda-redes. Como já não vai a tempo, trata de pedir à federação espanhola de futebol para «adoptar medidas disciplinares» contra José Mourinho por ter dito o que disse. Um Mourinho caladinho e temeroso, envergonhado, isso sim, fazia-lhes falta. Nisto transformaram a Espanha – esta gente de plástico e de acrílico, desenhada à imagem de Zapatero. Uma tristeza.

in A Bola - 20 Novembro 2010

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novembro 19, 2010

Blog # 740

Em Macedo de Cavaleiros, Bragança e Moncorvo, uma associação cultural, a Potrica, deposita livros nas mesas dos cafés. A ideia é que as pessoas aproveitem a ida a um café para ler ou para, suponho eu, saberem que há livros. Nas grandes cidades há livros – mas já não há cafés onde as pessoas possam ler. Há um grande desencontro entre os livros e os cafés, mas vale a pena tentar reuni-los. Um dos símbolos da Europa, dizia George Steiner, eram os cafés: lugares de diálogo, de encontro e de solidão, foi à mesa dos cafés que nasceram algumas das ideias mais belas do nosso tempo. Já a crise económica, por exemplo, nasceu em folhas de Excel mal construídas entre gente que não sabe o que são esses lugares antigos, os cafés. Aproveitemos a crise. Regressemos à mesa do café.

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Estará aí por estes dias: ‘Comer Animais’, de Jonhatan Safran Foer (Bertrand). O livro é um ‘ficção-verdade’ sobre carnívoros, vegetarianos e a violência da própria alimentação. Uma surpresa para a temporada, não?

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FRASES

"Sim. É para sempre. É um corte para sempre." Teixeira dos Santos, sobre os cortes salariais. Ontem, no CM.

"Razão tinha Churchill: os adversários estão fora de portas; os inimigos estão intramuros." Pedro Correia, no blogue Delito de Opinião.

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novembro 18, 2010

Blog # 740

O jovem Harry Potter cresceu. Acompanhei-o desde o primeiro livro e, também, desde o primeiro filme. Ao contrário dos teólogos e dos pedagogos, penso que Harry tem virtudes teologais e pedagógicas – e que é, além do mais, um rapaz honesto, sensato e corajoso. Nos últimos anos da cultura popular (essa mescla de Lady Gaga com rappers americanos e séries de tv sobre crimes e autópsias), houve poucos ícones tão saudáveis como ele, tirando os ‘personagens bons’ de ‘O Senhor dos Anéis’. Num mundo idiota e onde os idiotas tomaram o poder, Harry é inteligente, estuda e sabe magia. Tem a vantagem de, ao contrário de outros adolescentes, viver num colégio interno onde se sabe quem são os mestres e quem podem ser os pérfidos. Agora, que os preconceitos contra Harry Potter começam a perder sentido, apetece recomeçar tudo do princípio. Leiam e vejam.

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A Oficina do Livro publica ‘O Império dos Espiões’, de Rui Araújo – uma viagem ao mundo da espionagem portuguesa durante a II Guerra e, mais tarde, nas nossas antigas colónias. Um mundo (aparentemente) desconhecido.

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FRASES

"Andam por aí muitos cérebros a dizer que os indígenas deviam ser proibidos de votar." António Ribeiro Ferreira, ontem, no CM.

"Por isso é que a democracia é tão bonita, e os diversos ramos da polícia tão necessários." Maradona, no blogue A Coisa Foi Modificada.

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novembro 17, 2010

Blog # 739

No fim do seu primeiro mandato, José Sócrates reconheceu que era preciso "mais investimento na cultura". A palavra "investimento" é uma espécie de cura para todos os males quando não há ideias – mesmo quando não há dinheiro ou, sobretudo, quando ele está a faltar. A crise económica (para abreviar) obrigou a cortes indispensáveis, mas Sócrates desautorizou-os (e à ministra da Cultura) porque tem medo da impopularidade. Está no seu direito, e é inteiramente legítimo que um político escolha as suas prioridades e a forma de enganar as sondagens. É uma longa procissão de dinheiro mal gasto, de falta de cumprimento de promessas e de palavras ocas. Não houve "mais investimento" nem poderia haver. Os agentes culturais bem podem protestar. Sobretudo contra a pobreza de espírito.

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novembro 16, 2010

Blog # 738

Entre Novembro de 2010 e Setembro de 2011 a Biblioteca Nacional encerra as suas portas para obras que, com o tempo, se tornaram indispensáveis e inadiáveis. Ou seja, durante um ano os investigadores e leitores terão de se dirigir a outras bibliotecas – ou aguardar. É um longo período. Este encerramento prova que os livros têm uma “vida física” própria e que precisam de cuidados permanentes. Durante décadas, a BN foi um monstro que maltratava os seus leitores; com o tempo, o acesso tornou-se mais fácil e cómodo. Há muito a fazer e esperamos, todos, que esta pausa também sirva para modernizar ainda mais o seu funcionamento. É bom que não seja, apenas, “a Biblioteca Nacional”, mas também “a Biblioteca”, um lugar de referência para a nossa toponímia cultural. Até para o ano.

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Aplausos para a Guerra e Paz, que publica ‘O Ano do Cometa’, do mestre galego D. Álvaro Cunqueiro – antes do realismo mágico latino-americano, já Cunqueiro escrevia sobre personagens que voavam e nunca morriam. Uma beleza.

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FRASES

"Pinochet deu-me uma gota de amargura que até hoje convive com a minha alegria." Antonio Skármeta, autor de ‘O Carteiro de Pablo Neruda’. Ontem, no CM.

"Os comentadores, em regra, são piores do que a classe política que amaldiçoam." Filipe Nunes Vicente, no blogue Mar Salgado.

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novembro 15, 2010

Blog # 737

O Igespar acha que a Linha do Tua não tem relevância cultural enquanto património a classificar. Ou seja, não possui valor arqueológico, arquitetónico, artístico, etnográfico, científico ou técnico e industrial. Provavelmente, tem os seus argumentos. Uma parte dela ficará debaixo de água quando a EDP construir uma barragem na foz do Tua com o Douro. O Igespar pode decidir e dar pareceres sobre o assunto – mas devia exigir que a EDP (que aproveita esse património “sem relevância cultural”) construísse uma estrada de onde uma das mais belas paisagens portuguesas pudesse continuar a ser vista e a comover os seus visitantes. A paisagem (a do Tua incluída) é um dos mais importantes patrimónios portugueses. O betão, as auto-estradas e as barragens têm vindo a destruí-la.

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Bem-aventurados os leitores de John Le Carré porque será deles o reino dos céus: esta semana chega às livrarias ‘Um Traidor dos Nossos’, o novo romance – perturbador e belíssimo, como de costume. Estou a lê-lo, darei novidades.

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FRASES

"Gosto essencialmente da coreografia e do espetáculo em si." Irene, 40 anos, espectadora de um show de striptease masculino. Ontem, no CM.

"O bloco central deixou de ser a solução e passou a ser o problema do nosso sistema político." Luís Naves, no blogue Albergue Espanhol.

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novembro 13, 2010

Desculpas

Estava escrito: o FC Porto devia ganhar ao Benfica. A expressão pode ser excessiva a ouvidos sensíveis, mas nada fazia prever (a não ser a injustiça e a falta de lógica que a anima) que o Benfica pudesse resistir à grande qualidade do futebol portista. O problema foi o da reacção exagerada a uma derrota inteiramente normal. No dia seguinte, quando esperava que o destaque fosse concedido à vitória do FC Porto, deparo com a crucificação de Jesus nas primeiras páginas, que há semanas o davam como o grande apóstolo da revalidação do título. Essa tentativa de assassinato é injusta e estrategicamente desmiolada. Ou seja: mais uma vez, à semelhança do que aconteceu com o guarda-redes Roberto, o benfiquismo elegeu um bode expiatório – agora o treinador. O objectivo é claro e limpinho: não manchar a «marca Benfica» nem o seu trilho de más decisões histriónicas. De quem é a culpa exclusiva das primeiras derrotas do Benfica nesta época? De Roberto. O pobre homem, arrancado a um banco de suplentes tranquilo onde gozava um salário moderado e tranquilizador veio defender uma baliza desguarnecida de defesa e arcar com a enorme responsabilidade de salvar as redes benfiquistas. Que azar. Felizmente que havia Roberto, ainda por cima estrangeiro. Depois de um penalti defendido e de meia-dúzia de actuações supimpas, está reabilitado. Agora, diante da derrota com o FC Porto, o arqui-responsável é Jorge Jesus, a quem o benfiquismo pôs a carreira em perigo e o emprego à beira do fim. Será? Inventou David Luiz para segurar Hulk? Queriam quem? O cotovelo de Luizão?

2. O caminho é este: de bode expiatório em bode expiatório, até conseguir um honroso segundo ou terceiro lugar. Tudo menos reconhecer que André Villas-Boas não merecia as subtis ou alarves ironias que teve de suportar no arranque da época, tudo menos reconhecer que o providencial roubo de Hulk (na época passada) ajudou na conquista do (indiscutível) título, tudo menos reconhecer que o FC Porto está, de facto, a ocupar o seu lugar.

in A Bola - 13 Novembro 2010

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novembro 12, 2010

Blog # 736

Correm vários protestos contra a extinção da Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas. Antes deles, já aqui me declarei contra a medida tomada pelo governo – mas convém acentuar que ela é absurda. A decisão foi tomada em cima do joelho, ou no afã de liquidar institutos desnecessários ou com a finalidade, subtil, de lidar com problemas institucionais. Nada de conspirações. O protesto ultrapassou as fronteiras e a principal petição contra o encerramento veio de Itália, pela mão de Giorgio Di Marchis, um grande amante da nossa cultura. O trabalho de divulgação e de apoio ao livro português precisa de um organismo próprio e especializado, com as suas cumplicidades no planisfério. Se este governo não recuar, esperemos que o próximo reponha o bom senso e recupere a DGLB.

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Em tempos de turbulência, 470 páginas de economia política: ‘Marx & Keynes. Os Limites da Economia Mista’, de Paul Mattick (Antígona). Uma revalorização do marxismo, contra as “cedências” de Keynes. Ler para debater.

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FRASES

"O preço é essencial para os utentes saberem o que compram." João Cordeiro, presidente da Associação Nacional das Farmácias. Ontem, no CM.

"Na Eternidade não há Roque-Enrole mas podem crer que os bons soldados serão recompensados." Tiago Cavaco, no blogue Voz do Deserto.

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novembro 11, 2010

Blog # 735

O Tribunal de Contas, cuidadoso, voltou ontem a levantar dúvidas sobre os e-programas, ou seja, e.escola, e.professor e e.escolinha. São programas relacionados com o computadorzinho Magalhães. Além dessas dúvidas, o Tribunal pede para que periodicamente, sejam publicados dados sobre a execução dos referidos programas. O problema dos computadores nas escolas é mais grave. Em vários países onde a experiência se realizou, os resultados foram péssimos. Nos EUA, por exemplo, a melhor das escolas secundárias de Nova Iorque, a Liverpool High School, proibiu computadores nas escolas a partir de 2007, porque os níveis de aprendizagem tinham descido de forma assustadora. Em Portugal, muito moderninhos, começámos em 2007 a lançar as bases dessa enormidade. Sempre a tempo.

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Depois da biografia de Sá Carneiro, de Miguel Pinheiro (Esfera dos Livros), a Oficina do Livro reedita ‘Francisco Sá Carneiro. Solidão e Poder’, a biografia de Maria João Avilez. Passam vinte anos sobre o atentado de Camarate.

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FRASES

"Há quem diga: ‘Eu tinha razão.’ Esta euforia só pode vir de quem não pensa governar." Tomás Vasques, no blogue Hoje Há Conquilhas

"Vou partir-te todo quando sair." José Pereira, condenado a 10 anos de prisão, para um cúmplice, condenado a ano e meio. Ontem, no CM.

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novembro 10, 2010

Blog # 734

Chico Buarque ganhou o Prémio Portugal Telecom de literatura. Uma semana antes tinha ganho o Jabuti de ficção – o mais clássico dos prémios brasileiros – apesar de ter ficado em segundo lugar na categoria ‘romance’, o que é, no mínimo, uma originalidade. A distinção coube a ‘Leite Derramado’, uma obra mediana e longe da qualidade de ‘Budapeste’. Na história dos prémios há sempre polémicas; a atribuição destes recentes prémios literários a Chico Buarque não deixam de fazer supor que há motivos políticos (no caso do Jabuti, entregue ao som de ‘Dilma! Dilma!’, o que o autor não merecia) ou puramente estratégicos e de popularidade. A Chico Buarque devemos algumas canções muito belas e as senhoras devem-lhe uma admiração compreensível. Não estraguemos esse capital.

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Hoje destacamos um dicionário, imagine-se: o clássico ‘Dicionário da Língua Portuguesa’, da Porto Editora, passa por mais uma reforma ortográfica – aí está a sua nova edição, atualizada e acessível nas livrarias.

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FRASES

"Com os chineses não se pede, negoceia-se. […] Somos necessitados mas eles não são caridosos." Pedro S. Guerreiro, ontem, no CM.

"Há quem viva acima das suas possibilidades económicas e quem viva acima da sua inteligência." No blogue O Ouriquense.

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novembro 09, 2010

Blog # 733

O Goncourt é hoje um prémio sem a vital importância de outros tempos, quando era disputado por livros efetivamente lidos. Mas a sua atribuição a Michel Houellebecq (nascido em 1956) é uma revolução na mais recente tradição literária do prémio. Houellebecq é o provocador, o politicamente incorreto, o autor ameaçado pelos radicais muçulmanos e detestado pela esquerda, o misantropo que tenta, nos seus livros, uma crítica do afecto e da ‘perda do humano’. Não faltarão, contra ele, vozes e estandartes estabelecidos sobre o preconceito. Na literatura europeia atual (um conceito inexistente) Houellebecq é um solitário talentoso, isolado, invejado e mal querido. O Goncourt reconhece, pelo menos, o seu inegável ‘direito a existir’ e a ser mencionado nas letras francesas.

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No meio das publicações sobre o centenário da República, ‘O Cidadão Keil’, de Rui Ramos (D. Quixote) merece atenção: um estudo sobre o autor do hino nacional e o seu significado no contexto do patriotismo republicano. Sai este mês.

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FRASES

"Há os Direitos Humanos e o Tibete, mas […] essas vozes são escondidas para não incomodarem." Armando Esteves Pereira, ontem, no CM.

"Alguém deve agarrar Alegre. Ser deputado trinta e tal anos afasta qualquer um da realidade." Tomás Vasques, no blogue Hoje Há Conquilhas.

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novembro 08, 2010

Blog # 732

A ministra da Cultura, no Parlamento, defendeu uma partilha da responsabilidade do Estado com a sociedade civil no que diz respeito a fundações como Serralves, CCB ou Casa da Música. Era bom que assim fosse. O Estado despenderá este ano 6 milhões com a do CCB, 4 com a de Serralves, 1,5 com a coleção Berardo e 8 (oito, atenção) com a da Casa da Música no Porto, para mencionarmos as mais importantes. A responsabilidade do Estado é elevada. A isso deve corresponder um esforço de contenção e de programação. De qualquer maneira, são importantes estas declarações da ministra; elas revelam até que ponto vai a participação estatal e até onde vai a míngua de participações da “sociedade civil”, ou seja, de instituições privadas. Muita coisa vai ter de mudar nos próximos anos.

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Não resisto: a 11/17, coleção de bolso, acaba de sair a ‘Breve História de Quase Tudo’, de Bill Bryson. Género? Híbrido. Matéria? Tudo o que vem à rede em ciência. Ritmo? Acelerado, às vezes alucinante, sempre tentador.

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FRASES

"Estamos muito agradecidos pelo apoio que tivemos aí no Estoril." Kathryn Bigelow, realizadora de ‘Estado de Guerra’, sobre a guerra do Iraque. Ontem, no CM.

"Num mercado como o editorial é melhor uma previsão falível do que uma dança da chuva." Luís M. Jorge, no blogue Vida Breve.

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novembro 06, 2010

Blog # 731

António Barreto conseguiu um milagre – o que, em Portugal, ainda é possível aos seres humanos. Através do Pordata, sítio criado na Fundação Francisco Manuel dos Santos, coloca-nos a todos na internet, acessíveis. Através deste enorme banco de dados podemos saber melhor como somos, o que fazemos, como gastamos o nosso dinheiro e, por aproximação, o que pensamos do nosso país e do futuro. Onde o Estado esconde números e os falsifica de acordo com a época, António Barreto e o Pordata mostram estatísticas e fornecem ferramentas para fazermos as nossas próprias contas. Se fossem números, apenas números, já era um melhoramento substancial na nossa vida. Só que esses números também nos ajudam a fazer escolhas. Devíamos, todos, agradecer-lhe. Obrigado, António Barreto.

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A Verbo acaba de lançar ‘Gene, Célula, Ciência, Homem’, uma recolha de pequenos artigos e de entrevistas de Manuel Sobrinho Simões, o cientista que fundou e dirige o IPATIMUP. Um motivo de orgulho para nós, portugueses.

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FRASES

"É verdade: não uso Facebook." Jesse Eisenberg, ator no filme ‘A Rede Social’, em que interpreta o papel de Mark Zuckerberg, criador do Facebook.

"Se os mercados não se acalmarem passa a ser anti-patriótico ter discordâncias com o Governo." João Miranda, no blogue Blasfémias.

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novembro 04, 2010

Blog # 730

A chamada “Academia Sueca” é uma coleção de bonzos que nunca estão sujeitos a escrutínio, defendidos por aquela couraça impertinente que lhe é conferida pelo imenso poder de, anualmente, atribuírem o Nobel da Literatura. Que seja eu a dizê-lo é uma coisa; mas desta vez é Knut Ahnlund, membro do grupo e citado pelo jornal espanhol ‘ABC’, em vésperas de publicar um livro sobre o assunto. Suponho que Ahnlund sabe do que fala: assistiu a reuniões dos génios que atribuíram o prémio a Dario Fo e se recusaram a ter uma palavra de apoio a Rushdie, perseguido de morte pelos fanáticos; além do mais, tomou nota da ignorância da companhia. Quando o livro aparecer, daqui a umas semanas, será um acontecimento. Um pouco de discussão fará bem a tanta vaidade sonolenta e tanto poder.

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Já que falei de um Nobel, pois venha um Nobel – como Naguib Mahfouz, o grande escritor egípcio. A Civilização, que já publicou vários livros de Mahfouz, acaba de lançar ‘O Novo Cairo’, traduzido do árabe por Badr Hassanein.

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FRASES

"Este orçamento não é nada comparado com o que estará para vir." Octávio Ribeiro, ontem, no CM.

"Entre nós, não há propriamente acontecimentos. As coisas rompem. É tudo." Jorge Costa, no blogue O Cachimbo de Magritte.

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novembro 02, 2010

Blog # 729

Hoje, neste dia, devíamos lembrar os mortos – recordar os nossos mortos, os que nos fazem falta, os que partiram antes, os que nos fizeram ser de uma maneira ou de outra, os que deixaram uma marca ou os que, e isso não é pouco, pertenceram à nossa vida. O tempo presente tem medo dos que partem e esquece-os com bastante frequência; no domínio público, ou transforma a morte em espetáculo (uma vingança que mal se apercebe, produto do ressentimento) ou numa cerimónia envergonhada. Parar um instante para recordar a lista de ausências devia ser um gesto ritual, parte dos nossos dias e da nossa fragilidade. O amor insolente pela juventude e o desprezo pelos anciãos são aspetos da vida de hoje, em que esquecemos a dignidade da morte, o sofrimento e a sabedoria mais antiga.

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A Guimarães (Babel) iniciou a série das obras completas de Maria Helena da Rocha Pereira com ‘Romana’, uma antologia de textos latinos imprescindíveis. M.H. Rocha Pereira merece esse trabalho e a nossa homenagem de leitores.

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FRASES

"Na novíssima religião só se admitem teodiceias económicas." No blogue O Jansenista

"Tão grave é a situação que até nos envergonhamos de falar nela." Luís Marques Mendes, ontem, no CM.

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novembro 01, 2010

Blog # 728

A divulgação dos salários ou retribuições da Guimarães Capital Europeia da Cultura (coisa que ocorre em 2012) não é um “momento alto” da sua programação – a verba rondará os 8 milhões de euros, um número redondo cuja execução convém acompanhar. A desconfiança que se abate sobre as ‘parcerias público-privadas’ tem toda a razão de ser. Depois de conhecidos os números escandalosos da Casa da Música, com uma ‘derrapagem’ de perto de 200%, os grandes investimentos públicos na área da cultura (ainda assim não comparáveis criminosos ‘buracos’ descobertos nas obras públicas desta década) prometem sempre deslizes orçamentais. Os gestores e promotores desses ‘eventos’ não devem esquecer que se trata de dinheiro dos contribuintes, um bem cada vez mais escasso e sob vigilância.

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Depois de Stieg Larsson: é o que se pode dizer de ‘Sangue Vermelho em Campo de Neve’, de Mons Kallentoft, o autor sueco que criou a fantástica inspectora Malin Fors, uma personagem que vale a pena conhecer e manter por perto.

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FRASES

"O povo não costuma agradecer a ‘responsabilidade’ dos carrascos." João Pereira Coutinho, ontem, no CM.

"Fica a impressão de que Portugal seria governado por génios caso não houvesse eleições." José Medeiros Ferreira, no blogue Córtex Frontal

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