janeiro 30, 2009

Blog # 278

Há uma suspeita sobre os "processos" e as "investigações em curso" sob "segredo de justiça" e que são publicados ou circulam entre agentes do poder. A República não pode estar na mão de traficantes de fotocópias ou de espiões vulgares. O novo sistema informático dos tribunais portugueses, o Citius, parece permitir a "consulta" dos processos por gente que lhes é estranha (o que acontece no actual, o Sitaf) – por um 'administrador informático'; a partir daí, por um amigo, um director-geral, um empresário interessado ou um ministro curioso. Alguns juízes protestam contra o facto e a possibilidade; o secretário de Estado, com boa-fé, nega que os políticos queiram meter-se na justiça. Claro. Mas existe a possibilidade de alguém ler, a meio, o trabalho de um juiz. Percebem?

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Nas livrarias, a segunda leva de livros de bolso da Leya: Poe, Lídia Jorge, Mário Cláudio, Lewis Carroll, Sá-Carneiro, Jorge Luis Borges, Nobre, Saramago, ou Pepetela. Preço simpático – é para isso que servem os livros de bolso.

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FRASES

"Não é a primeira vez que enfrento esta campanha negra." José Sócrates, ontem, no CM online

"Fomos educados a desvalorizar 'a política' e o resultado está à vista." Lourenço Ataíde Cordeiro, no blogue Complexidade e Contradição.

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janeiro 29, 2009

Blog # 277

John Updike, desculpem voltar a ele, não se despediu convenientemente. Lembro-me de Updike por causa de 'As Bruxas de Eastwick', de que gosto muito, e das aventuras do seu 'Coelho' – os críticos, muito globais, dizem que é a 'América profunda' que ali está. Não: é o género humano e escusam de particularizar. Aquelas mulheres de uma pequena cidade americana vivem por aqui e por ali, disponíveis para aventura e pecado, para sexo e metafísica, marijuana e elevação. O 'Coelho' sai da província e enriquece com a mesma manha aqui e ali, com mais dignidade nuns sítios do que noutros. E os personagens de 'Casais Trocados' embelezam a mediocridade da vida sem picante. Soberba imoralidade, a de Updike. A mesma de Philip Roth, em 'O Complexo de Portnoy'. A mesma com que sonhamos.

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Mais poesia para Janeiro: 'Antologia da Poesia Grega Clássica' (Portugália), com tradução e notas de Albano Martins. Quando as palavras se repetem, convém ir ao princípio de tudo. Esta poesia ainda respira o princípio das coisas.

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FRASES

"O Freeport, é um processo em que se buscam elementos de cruzamento de informação." Cândida de Almeida, DCIAP, ontem no CM.

"O tio de Sócrates é o tio que todos os políticos gostariam de ter." Paulo Pinto Mascarenhas, no blogue ABC do PPM.

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janeiro 28, 2009

Blog # 276

País de plástico e de acrílico. É isto que somos. Veja-se o relatório da DECO sobre o estado dos 'lares de idosos': insegurança, más condições e tristeza. No Portugalinho moderno, jovem, divertido, os velhos contam pouco; a linguagem oficial chama 'idosos' aos velhos e dá o nome de 'casas de acolhimento' aos lares – mas só muda os nomes, porque a indiferença, a insensibilidade e a ingratidão estão lá na mesma, aguardando que os velhos partam de vez sem incomodar as famílias. E para que se hão tratar bem os velhos? Precisamente porque um país que não trata bem os velhos não é bem um país: é uma coisa miserável que desconhece a gratidão e o conforto. O Estado, que gasta milhões a apaparicar os 'jovens', cada vez mais egoístas e arrogantes, devia pensar um pouco nos nossos maiores.

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Já está, já está impresso e pronto a sair para as livrarias: 'Ofício Cantante', de Herberto Helder, reúne toda a poesia do autor (edição Assírio & Alvim), incluindo títulos esgotados: 4500 exemplares e capa com pintura de Ilda David.

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FRASES

"As pessoas não dão importância, vai acabar por não dar em nada. É publicidade gratuita." Sandra Borges, lojista do Freeport, ontem no CM.

"Não sei como é que fui nascer portuguesa. Eu que lhes tenho um pó que nem sei." Isabela, no blogue O Mundo Perfeito.

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janeiro 27, 2009

Blog # 275

Assinala-se hoje o aniversário de Wolfgang Amadeus Mozart. Não é um acontecimento propriamente dito, mas apenas uma efeméride que lembra o primado da imaginação, da criatividade – e do trabalho que lhes está associado. E da arte. E, depois, da cultura. O aniversário de Mozart devia obrigar as nossas escolas públicas a ouvir música uma vez por ano. Faz-nos falta, a música. Sobretudo num sistema educativo que (em vez de ter aulas de música obrigatórias) a desvalorizou, como se fosse um apêndice inútil e despropositado. Nessa matéria, os nossos intelectuais são frios e surdos. Ao recordar Mozart não é apenas a sua música que se recorda: mas também a evidência de que não se pode viver sem êxtase ou deslumbramento. Há quem pense que isto são minudências. Experimente ouvir. Hoje.

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É o regresso do velho grafismo da bela colecção de poesia da Portugália Editora (a de Cabral do Nascimento): recomeça agora com "A Vida de Maria", de Rainer Maria Rilke, traduzido e prefaciado por Maria Teresa Dias Furtado. Óptimo.

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FRASES

"Alguém, no seu juízo, acha Sócrates um coitadinho perseguido por tenebrosos interesses?" João Gonçalves, no blogue Portugal dos Pequeninos.

Os avisos e as ameaças [de Sócrates] só podem ter como alvo os polícias britânicos." António Ribeiro Ferreira, ontem no CM.

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janeiro 26, 2009

Blog # 274

O problema é este: a indústria jornalística da corrupção é tão produtiva que não sabemos distinguir uma suspeita de uma investigação real. Habituámos a ambas, às suspeitas e às investigações – e não damos grande crédito a qualquer delas, porque os resultados são mínimos. Isto é mau para a democracia, ou seja, para a sanidade da República. Daqui a alguns anos, por este caminho, uma suspeita há-de ser suficiente para se armar um escândalo público; e uma investigação judicial há-de ser tão desvalorizada como um golo num estádio português diante de um árbitro medíocre. Portugal habituou-se a viver no meio da falta de credibilidade nos negócios, na política, na justiça. A palavra de ordem, num país onde o carácter e a aldrabice não conhecem fronteiras, é "desconfiar sempre".

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"Os Intelectuais", de Paul Johnson (Guerra e Paz) é um livro de leitura obrigatória. A lição é esta: não confie nos intelectuais. Por detrás de uma boa ideia há um carácter desprezível e um ser que nunca sentaríamos à nossa mesa.

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FRASES

"Sobretudo em época de crise, de dificuldade, as pessoas são vulneráveis a pressões." Paulo Mota Pinto, ontem no CM.

"Há probabilidades de ter tido, na noite passada, um sonho homoerótico com Medeiros Ferreira." Rogério Casanova, no blogue Pastoral Portuguesa.

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janeiro 23, 2009

Blog # 273

Há dois anos que regressei à caneta de tinta permanente. Recuperei o prazer de escrever à mão, de tomar notas, de melhorar a caligrafia, de desenhar as letras e as frases. É uma velharia, certamente, no país onde se distribuem computadores Magalhães a crianças que ainda não sabem escrever. Mas insisto, compro caderninhos, escolho o papel – e sinto uma certa inveja à minha volta. Ontem, as estatísticas mostraram-me que não estou sozinho: as vendas de discos em vinil aumentaram 50%. Tenho, como muitos leitores, a minha colecção de vinil – discos antigos, outros menos. Há aquele risquinho, aquele ruído de fundo que não vem nos CD. Temos saudades de coisas imperfeitas: da letra desenhada à mão, do som do vinil. São saudades dessa divina imperfeição que nos faz ser mais humanos.

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Livro essencial para quem quer entender a 'natureza do romance' e o papel da leitura na nossa vida e na nossa imaginação: 'A Consciência e o Romance', de David Lodge (edição Asa), uma colecção de ensaios. Preciosidade a não perder.

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FRASES

"Barack Obama vai mudar a América ou a América vai mudar Barack Obama?" Tomás Vasques, no blogue Hoje Há Conquilhas.

"Só cá tinha vindo combater fogos, agora é diferente. Em Setúbal não havia qualquer alerta." Bombeiro de Setúbal deslocado para a neve da serra do Marão, ontem no CM.

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janeiro 22, 2009

Blog # 272

Vejamos: 9,7% dos homens portugueses interrogados numa sondagem (ontem no CM) afirmam que 'têm sexo diariamente'; apenas 6,8% de mulheres o confirma. 59,5% de homens garante que a sua frequência anda pelas 2 a 4 'vezes' por semana; as mulheres ficam pelos 30,9%. Ora, como chegámos à diferença de 29%? Primeira explicação: os homens são infiéis. Sim, mas com quem, se os números não aparecem? Segunda explicação, à antiga portuguesa: 'parlapié' de gabarolas. É sempre assim. O sexo inundou a televisão da família, o cinema, a publicidade e as notícias comuns; tornou-se uma banalidade que apenas se 'pratica'. Os homens, quando perguntados pela sua performance, não querem ficar atrás e vendem gato por lebre, à campeão. Caem na esparrela. Elas, caladas, ficam muito melhor no retrato.

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Para acompanhar a polémica dos casamentos interreligiosos pode ler-se 'O Preço do Véu. A Guerra do Islão contra as Mulheres", de Giuliana Sgrena (edição Pedra da Lua); pagar esse preço (que é elevado) não parece ser o sonho de ninguém.

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FRASES

"São todos boas pessoas." Testemunhas do processo 'Máfia da Noite' sobre o grupo de arguidos, ontem no CM.

"Só Maradona tem o telecomando de Lady Di Maria (e não vai emprestá-lo)." Daniel, no blogue A Dieta de Rochemback.

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janeiro 21, 2009

Blog # 271

O bispo católico de Lancaster, Patrick O'Donoghue, atribui à educação superior grande parte dos males de que a sua igreja padece ou, pelo menos, afirma padecer – para o bispo, as pessoas que frequentaram escolas superiores e universidades andam por aí a "espalhar o cepticismo" em vez de seguir à risca os mandamentos e, além do mais, são pessoas egoístas que valorizam o hedonismo. A educação, acrescenta, tem um "lado negro": semeia a dúvida. Ora, eu acho interessantes estas declarações. Normalmente, ouvir-se-ia um coro de insultos e de denúncias contra o cavalheiro. Mas eu limito os danos à pergunta: a quem diz respeito esta arenga bispal? Aos católicos. Limito-me a pedir aos responsáveis da igreja que nos esclareça sucintamente: são todos assim ou é só um vírus de Lancaster?

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O livro ocupa 850 páginas: trata-se da 'Poesia Reunida' de Maria Teresa Horta (edição da Dom Quixote), com prefácio de Maria João Reynaud. A D. Quixote publicará ainda este ano o segundo romance de Maria Teresa Horta.

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FRASES

"Confirmo um aumento da criminalidade, mas estamos a aguardar dados." Mário Mendes, secretário-geral de Segurança Interna, ontem no CM.

"Por mim, desde que o futebol não seja obrigatório, a vida continua muitíssimo bem sem ele." No blogue O Jansenista.

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janeiro 20, 2009

Blog # 270

Ouço uma e outra vez o seu discurso ('Yes, we can...') e vejo como cresceu e como todos nós nos fomos convertendo à ideia de ter esperança em Obama, nem que seja para devolver um pouco de auto-estima à América desiludida com o mundo e sitiada diante de inimigos visíveis e invisíveis. A partir de hoje, não será mais o senador promovido a estrela global: esperam-se dele grandes coisas, o que é grave e o obriga a caminhar no fio da navalha. Em boa parte, não poderá corresponder às expectativas porque elas são mais do que prometeu. Muitos esperam que Obama faça o que eles não fizeram antes e estão dispostos a cobrar pesado. Seja como for, a América já deu um salto em frente só por tê-lo eleito. Sim, também por ser negro. É uma coisa simples que não tem a ver com a cor da pele.

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E se a 10.ª Sinfonia de Beethoven existisse mesmo? É esse o ponto de partida para o 'thriller musical' de Josph Gelinek (um pseudónimo), 'A Décima Sinfonia' (Casa das Letras), um mistério à antiga, saboroso e desmiolado, sem limites.

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FRASES

"Foram dando pancadas na montra com a traseira do BMW." J. Augusto Silva contando como assaltaram a sua ourivesaria, ontem, no CM.

"Em comparação com 2005, há uma vantagem: já sabem o que Sócrates faz às promessas." Pedro Correia, no blogue Delito de Opinião.

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janeiro 19, 2009

Blog # 269

Éramos da mesma idade mas de gerações diferentes. Ela chegou antes a vários lugares – a muitos livros e intuições. Tereza Coelho, que agora partiu, não foi apenas uma das nossas melhores jornalistas da área da cultura; foi também uma editora que mudou o mundo à sua volta. No ano passado morreram dois editores invulgares, corajosos e cultíssimos, que transformaram o mundo da edição, Rogério de Moura (Livros Horizonte) e Figueiredo de Magalhães (o genial criador da Ulisseia). De algum modo, é uma parte do mundo da edição que desaparece e fica mais pobre. Não podia ser de outra maneira: editar não é publicar livros. É chegar antes a vários lugares; aos livros, mas sobretudo aos livros que fazem falta a alguém que não é como nós. É escolher. É imaginar. Imaginar o mundo.

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Autores que não param, não desistem – por falar nisso: António Lobo Antunes vai publicar novo romance. Gonçalo M. Tavares publicará três novos livros em 2009. Novos romances ainda este ano: José Eduardo Agualusa e José Luís Peixoto.

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FRASES

"A qualidade das pessoas que estão na política decaiu muito nos últimos anos." Campos e Cunha, ex-ministro das Finanças, ontem no CM.

"Passos Coelho diz que não se pode parar o TGV e que não há condições para avançar com o TGV." Filipe Nunes Vicente, no blogue Mar Salgado.

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janeiro 16, 2009

Blog # 268

Chamo a atenção do leitor para esta observação: "Fiz algumas contas e verifiquei que a venda de entradas não representa assim tanto para os museus." Portanto "deveriam ser todos de entrada gratuita para a população". É muita generosidade. Por mais que nos custe a acreditar, esta ideia peregrina é de Joe Berardo, o proprietário de uma vasta colecção de arte contemporânea que o empresário disponibilizou "à população" no Centro Cultural de Belém depois de ter obtido sérias e valiosas garantias do Estado. A generosidade com o dinheiro do Estado é fácil. Mas seria bom perguntar pela generosidade dos empresários e dos ricos em relação "à população". Eu, por exemplo, fiz algumas contas e verifiquei que os dinheiros do Estado ainda representam alguma coisa para o empresário Joe Berardo.

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É uma autobiografia estranha, densa, cheia de factos e de coragem: 'É Melhor Partires de Madrugada', do prémio Nobel africano Wole Soyinka (edição Pedra da Lua) colecciona perplexidades e denúncias, num ritmo alucinante, imparável.

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FRASES

"[Há muitos teólogos e padres que] preferem ver casamentos que são verdadeiros calvários." Padre Costa Pito, ontem no CM.

"Há vinte anos, a ilusão da Europa intoxicou os portugueses. E, há dez, o euro potenciou o delírio." Eduardo Pitta, no blogue Da Literatura.

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janeiro 15, 2009

Blog # 267

Foi um burburinho incessante por causa das declarações de D. José Policarpo e do seu pequeno reparo sobre casamentos mistos. Acontece que o cardeal (injustamente acusado de 'intolerante') tem razão – no que a imprensa citou, e que foi muito além da questão do casamento, e no que causou o burburinho. O que disse ele de tão chocante? Que as mulheres, antes de casarem com um muçulmano, devem pensar bem. Há exemplos bastantes sobre o choque e a violência – alguns vêm descritos em livros. O essencial foi isto: pensem bem, e pensem se estão dispostas a arriscar. Só que, no momento actual, pensar é uma actividade que parece ser ofensiva. Os multiculturalistas de pacotilha que reagiram com mais velocidade do que a sua própria sombra parece que já não estão habituados a fazê-lo.

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É um grande acontecimento: a Assírio & Alvim vai lançar 'Ofício Cantante. Poesia Completa', de Herberto Helder. Tem 624 páginas e vai custar 48 euros – reúne inéditos e também, os poemas do esgotado 'A Faca Não Corta o Fogo'.

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FRASES

"Nós somos muito ignorantes [...]. Quem é que em Portugal já leu o Alcorão?" D. José Policarpo, cardeal-patriarca, ontem no CM.

"D. José Policarpo estragou o sonho de todas as portuguesas: casar com um muçulmano e viver na Faixa de Gaza." João Tordo, no blogue Corta-Fitas.

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janeiro 14, 2009

Blog # 266

Paremos. Ontem foi o dia dos 30 anos dos Xutos & Pontapés e, se não fossem eles, aqueles rapazes distribuídos pelo palco, a cultura portuguesa seria mais pobre e mais amarga. Há quem pense que aquilo é só música, som, batida, ritmo eléctrico, guitarras e bateria, gritos mudos, multidão dançando. Não é. É mais: é a nossa cultura que se libertou do destino e passou a incorporar o rock como banda sonora. Sem eles, tudo seria diferente. Teríamos Rui Veloso, certamente. Mas não teríamos os Xutos, ou seja – aquela melancolia do rock, aquela doçura do rock. Sem eles seríamos mais aborrecidos, todos. Em Portugal gostamos muito de amaldiçoar o que temos de grande. Por inveja, feitio e ressentimento. Só que a música dos Xutos se ouve muito mais alto. Lá, onde a música não é só música.

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O novo livro de Tony Belloto, 'Um Caso com o Demónio' (Quetzal), guitarrista dos Titãs, vai ser lançado no mês que vem – coincide com o Fantasporto, onde é apresentado o filme homónimo. Para o lançamento vem Malu Mader, mulher de Tony.

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FRASES

"Este espaço é o símbolo de Portugal e os Xutos são a bandeira do rock. Está tudo certo." Manager dos Xutos & Pontapés sobre o Pavilhão de Portugal, ontem no CM.

"Dizem-me que o Prós & Contras de ontem foi sobre o Cristiano Ronaldo. Está tudo doido?" João Vacas, no blogue 31 da Armada.

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janeiro 13, 2009

Blog # 265

Dois homens (um de 24, outro de 33 anos) foram condenados a 11 anos de prisão por terem atacado um casal de namorados e violarem a rapariga. O Tribunal da Relação de Coimbra decidiu tirar um ano à pena. E porquê?, pergunta o leitor. Porque não se trata, diz o Tribunal, de "comportamentos espaçados no tempo", ou seja, não foi uma decisão continuada. Digamos que se trata de uma "violação rápida": os cavalheiros iam espreitar os casais de namorados e "aproveitar-se das raparigas". Para isso, estavam munidos de paus, gorros, máscaras e luvas, tendo partido os vidros de um carro que tentava fugir. De facto, 11 anos era demais. Digamos, vá lá, 10. Se tivessem prolongado o crime, então sim, seriam 11. O leitor que aprenda: o crime está lá; mas foi uma coisa rápida, na hora, .

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Fevereiro vai ser o mês de Nuno Bragança (1929-1985): a Dom Quixote lança toda a obra do autor de 'Directa' num só volume – com o texto 'A Morte da Perdiz', inédito. 'A Noite e o Riso' é um dos meus romances portugueses preferidos.

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FRASES

"O Trofense dá o que o Trofense tira." João Tordo, no blogue Corta-Fitas.

"Apontou-me a arma à cabeça, mas quando ia acender um cigarro consegui fugir." Maria Assunção, ex-sogra de Humberto 'Loucuras', ontem, no CM.

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janeiro 12, 2009

Blog # 264

O frio veio relembrar aos portugueses que não estamos nas Caraíbas. Mas há aqui, digamos, uma questão cultural. Tem a ver com "o alerta". Desde que a Protecção Civil está debaixo de olho que não há mês sem um "alerta". Alerta amarelo, alerta laranja – ou porque chove, ou porque vem uma ventania, ou porque o calor é de ananazes, ou porque está frio. "Estar frio" é uma coisa mais ou menos habitual no Inverno, mas a Protecção Civil avisa – foi abertura dos telejornais – que as pessoas devem vestir mais do que uma peça de roupa. As televisões rejubilam: como não têm os vinte graus negativos da Finlândia, fazem festa com com a nevezinha do Marão e com os cortes de estradas. Em vez de nos sentarmos em casa, sossegados, a ler os clássicos, a ideia é estarmos em "alerta amarelo".

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É já em Fevereiro que sai o novo e esperado romance de Pedro Almeida Vieira "A Mão Esquerda de Deus" (Dom Quixote). Vieira é autor de "Nove Mil Passos" e de "O Profeta do Castigo Divino", excelentes romances históricos. Estejam atentos.

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FRASES

"Tudo o que eu disse até hoje nos jornais são declarações sérias de um beirão sério." Pinto Monteiro, PGR, ontem no CM.

Santana Lopes pode não perceber de música clássica, mas é doutorado em táctica política." Paulo Gorjão, no blogue Delito de Opinião.

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janeiro 09, 2009

Blog # 263

Muitas coisas se poderiam dizer sobre Bénard da Costa e o seu papel à frente da Cinemateca Portuguesa, que agora abandona. Uma delas tem a ver com a sua paixão pelo cinema (o seu olhar aproxima-se do cinema como um tigre amável, devorando-o sem crueldade), obviamente. Outra, com as suas escolhas para a programação, sempre discutíveis ou indiscutíveis – mas boas. A Cinemateca, graças a Bénard e às suas equipas, transformou-se num lugar essencial da nossa geografia cultural. Talvez ela precise de outro sangue, e Pedro Mexia é um nome capaz de renovar a casa. Eu lembro sobretudo os seus textos (sobretudo um deles, o mais notável e genial, intitulado "As Mamas de Jane Russell") e o seu sofrimento amoroso pelo cinema. E acho que ele merece a nossa homenagem. E o nosso respeito.

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Advirto-vos que há leitura: a Dom Quixote acaba de publicar (tradução de Ana Maria Chaves) 'Nostromo', de Joseph Conrad. O subtítulo ('Uma história à beira-mar') é grandioso. Mas o livro lembra o poder extraordinário da literatura.

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FRASES

"Não deveria ser a governante [ministra da Saúde] a falar sobre Programas Nacionais de Saúde." Fonte do PS, ontem no CM.

"O Quique Flores [era] uma Carmen Electra. Apresentava um peito protuberante e distractivo." Padinha, no blogue Obrigado Sá Pinto.

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janeiro 08, 2009

Blog # 262

Portugal instituiu a quota mínima de um terço de mulheres presentes nas listas de candidatos ao Parlamento. Pessoalmente, acho injusto: se se trata de representar a população, quota por quota, o número deveria oscilar pelos 52%. É essa a percentagem de mulheres na população portuguesa. Mesmo assim, o governo socialista só tem duas mulheres nos ministérios, o que o deixa na cauda da Europa. Na Argentina não foi preciso recorrer a quotas. O exército acaba de enviar uma guarnição de nove mulheres para uma base da Antárctida, a 3.500 kms ao sul de Buenos Aires. Sozinhas. É a primeira vez que isso acontece na história militar, tirando a Atlântida, de que não sabemos nada. Portanto, que desculpem os leitores: o meu coração está a 14.000 kms com a operadora de rádio Vilma Cardozo.

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LIVROS DO ANO (12): é um dos grandes clássicos do Ocidente, mas a sua publicação em Portugal tardava; saiu em 2008 (Relógio d'Água): "Da Democracia na América", de Tocqueville – já não há desculpa para a preguiça de muitos políticos.

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FRASES

"Compreendo os pais que não deixam os filhos ir para artistas. Eu não deixava." Alexandre Borges, no blogue Sinusite Crónica.

"Como não era nu integral e havia efeitos de contraluz, acabou por ser mais simples." Cláudia Vieira, actriz, ontem no CM.

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janeiro 07, 2009

Blog # 261

As coisas devem ter preço. Ver um filme, assistir a um concerto, comprar um livro, por exemplo, são coisas que devem ser pagas pelo consumidor, que lhes atribui um certo valor. Ao distribuir 42 milhões de bilhetes gratuitos pelos seus consumidores, a Tv Cabo tomou uma decisão empresarial, é verdade – mas que levaria um espectador das salas Lusomundo a pagar pelas pipocas mas não pelo filme. A Autoridade da Concorrência teve dúvidas sobre essa campanha (a MyZonCard) e mandou suspendê-la. O operador acha que essa decisão é "injustificada e lesiva dos interesses dos consumidores". Tem razão, porque pode ser lesiva dos interesses dos 'seus consumidores' – mas não é injustificada, uma vez que transformaria as salas de cinema (que já são más) em dependência da televisão por cabo.

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LIVROS DO ANO (12): em 'O Complexo de Culpa no Ocidente' (Europa-América), Pascal Bruckner analisa a forma como a apatia e o desleixo se foram fixando numa Europa carregada de masoquismo, de renegação e de vergonha do passado.

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FRASES

"Quem não se está a safar nada bem é a maioria dos portugueses." Vítor Dias, no blogue O Tempo das Cerejas.

"Disseram-me que por cada vitória do Benfica faria felizes seis milhões de pessoas." Quique Flores, ontem no CM.

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janeiro 06, 2009

Blog # 260

O problema de Israel é existir. Assim, é um incómodo pelo qual ainda vamos pagar, como avisam umas almas penadas. Melhor fora se não existisse. Ainda por cima, incompreensivelmente, os israelitas não aceitam ser alvos pacíficos dos mísseis e morteiros disparados com regularidade pelo Hamas – e reagem, contra tudo o que seria normal. O ideal era que se mantivessem a fazer os seus negócios, a ir à escola e a fazer circular os seus autocarros, que o Hamas mandaria explodir; mas que não reagissem. Em vez de uma sociedade pluralista e meio louca, com imprensa e eleições livres, teríamos um território dominado pelo Hamas e comandado pelos seus assassinos profissionais. O problema é o mesmo de sempre: Israel insiste em existir e, pior, em reagir aos ataques. Não aceitam ser alvo.

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LIVROS DO ANO (11): Em 'Os Próximos 50 Anos' (edição da Esfera do Caos), John Brockman reúne uma série de ensaios sobre como vai ser a nossa vida no futuro; e como vão surgir novas formas de organização da sociedade e da cultura.

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FRASES

"O sobrinho da Tia Lola ainda há-de pôr o Makukula na baliza." Filipe Nunes Vicente, no blogue Mar Salgado.

"Tenho de optar pela batida ao piton contrário, em sortes cambiadas, com adornos mais vistosos." Manuel Lupi, cavaleiro, ontem no CM.

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janeiro 05, 2009

Blog # 259

Hoje é o começo. Estivemos um mês à espera deste dia, o começo verdadeiro de 2009, com aulas e trabalho a sério. Pelo meio assistimos a toda a espécie de previsões e fizemos as nossas, preocupadas e desconfiadas. Também ouvimos discursos sobre como vai ser difícil o ano. Parece que vamos "entrar em recessão na economia", expressão que não quer dizer nada para os portugueses que atravessaram o último mês – e que julgaram, na sua inocência, que já estavam em recessão. O resto foi dito pelo Presidente, na sua mensagem de Ano Novo: gastamos mais do que produzimos. Significa que o aperto vai ser grande durante estes meses, com menos luxos, menos gastos, menos euforia. Os cépticos tinham razão, como sempre. O que não faz deles pessoas mais felizes: apenas estavam preparados.

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LIVROS DO ANO (10): "Diário de um Mau Ano", no Nobel sul-africano J.M. Coetzee (D. Quixote) é sobre "a idade e a mágoa e as lágrimas das coisas", romance sobre um escritor que vê como às vezes o mundo não tem sentido nenhum. Muito bom.

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FRASES

"Fiz em 2008 algumas coisas boas, mas não tenho testemunhas." Bruno Morgado, no blogue Hipnótico.

"As contrafacções em Portugal têm, normalmente, uma qualidade reduzida." Banco de Portugal, sobre falsificação de notas, ontem no CM.

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Sob a luz do passado

A mais genuína comida romana serve-se no Sor Margherita, um restaurante popular nas portas do gueto judeu de Roma. Pelo meio das suas mesas divididas entre os visitantes de ocasião e os clientes habituais que não precisam de consultar o cardápio manuscrito do restaurante, passam os sabores dos agnolotti recheados e cobertos de manjericão fresco, ou da pasta e fagioli, do baccalá in guazzzetto, ou de carcioffo alla giudia. Mas também dos seus vinhos temperados e frios, essenciais.

Convém reter o momento porque a comida é uma metáfora do prazer que Roma concede ao visitante: pratos saborosos, suculentos, evocando as arqueologias gastronómicas do Mediterrâneo (reunidas na trilogia composta de farinha, de azeite e de tomate) – e passeios belíssimos, a pé, atravessando pontes e bairros que dispõem do passado como de um luxo acessível, próximo e desmascarado. Ninguém visita Roma sem passar por estes restaurantes minúsculos, barulhentos, onde tudo é artesanal (das massas aos doces, sem falar da informalidade que lhe está na base). E, depois, caminhar: porque conhecer Roma, só a pé – para que a ligação entre o passado e o presente resulte quase perfeita, luminosa, indecente.

Roma é uma das cidades mais amigáveis de toda a Europa. O seu aparente caos ordena o traçado das ruas, o estacionamento «criativo», a invisibilidade da angústia do romano típico que tanto frequenta os mercadini da Piazza Navona como conhece e enumera os museus centenários e deslumbrantes, a céu aberto, disponíveis e abertos em permanência. Esse caos dissimula-se como uma pose verdadeiramente romana: faz parte da alma da cidade, informal e fácil. Tão fácil como aceder a todos os seus lugares – da Praça de São Pedro ao Coliseu, de Sant'Angelo às pizarias de bairro, onde falamos de futebol e descobrimos ingredientes maravilhosos na sua simplicidade.

É, também por isso, a cidade europeia que mais me comoveu – fácil, atraente, informal. Com aquele linguajar simples (chamar a uma rua Via delle Zoccolette, Rua das Putinhas, é de uma amabilidade a toda a prova) para designar coisas simples, Roma bem podia ser uma lição para os europeus de pacotilha & carteirinha, fabricados às dúzias em Bruxelas e carregados de regulamentos para tudo. Se a Europa fosse construída à imagem de Roma, seríamos mais felizes, menos tristes, mais ligados às coisas essenciais, mais tolerantes, mais discretos. Aquela suavísisima anarquia à beira das águas do Mediterrâneo manda-nos que sejamos também mais cultos – porque a cultura não tem nada a ver com a acumulação de conhecimento ou com a esquizofrenia da contemporaneidade. Tem, antes, a ver com uma certa elegância – a forma como nos cumprimentamos, como nos abraçamos, como nos ligamos aos lugares e às paisagens. Sob a luz do passado, essa Roma maravilhosa não tem shoppings nem ruas excessivamente largas: privilegia o «mais pequeno», para que nos sintamos absorvidos pelos seus becos, pelas suas ruínas, sob a luz do passado que protege e não exclui nem hostiliza.

Ser saudado, em Roma (com aquele bon giorno! que se distribui com generosidade), é já uma forma de lhe pertencer – àquela paisagem de fontes, ruas estreitas de «luz tépida» e filtrada por ramagens de vasos na altura dos telhados, por poeiras que nos acompanham de um bairro a outro, como se flutuássemos, livres e malandros, com aquela explosão de malícia que só Roma pode permitir. Ao caminhar pelas suas ruas sem passeios, pelas suas praças generosas, Roma bem merece outra visita.

in Outro Hemisfério - Revista Volta ao Mundo - Janeiro 2009

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janeiro 02, 2009

Blog # 258

O mais belo poema sobre a nossa língua, 'A Última Flor do Lácio', é brasileiro (de Olavo Bilac). Foi no Brasil, justamente, que entrou ontem em vigor o Acordo Ortográfico – e os principais jornais do país fazem questão de o cumprir; os manuais escolares irão adoptá-lo obrigatoriamente no próximo ano. Não se sabe se a população vai aceitar as regras definidas pela lei, mas há três anos de treino. Em Portugal a adaptação será mais difícil, até porque, durante muitos anos, nos julgámos 'proprietários da Língua'. Não somos mais. Permanecemos agarrados a ela como namorados românticos, o que é saboroso e nobre – mas não podemos fugir ao debate sobre a sua evolução e sobre uma grafia comum. Por agora, a burocracia escreverá de acordo com a lei. Os escritores escreverão como quiserem.

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LIVROS DO ANO (9): Para quem leu a biografia de Estaline, de S. S. Montefiore, recomenda-se 'O Jovem Estaline' (Alêtheia), do mesmo autor, para ver o retrato de um espírito violento e de uma vontade sem limites. Tudo estava lá previsto.

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FRASES

"Estou muito feliz no clube e quero aqui ficar. Sinto-me em casa." Cristiano Ronaldo, ontem no CM online.

"Quando se fazia a contagem para a entrada no novo ano, tomei a decisão: não vou entrar em 2009." Nuno Costa Santos, no blogue Sinusite Crónica.

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