dezembro 23, 2006

Lembranças de Jesualdo e jogadores de eleição

1. Admito que Jesualdo Fer­reira se canse de chamar a atenção para pormenores, mas convém que os lembre, mesmo correndo o risco de ser um chato. O mais importante deles ocor­reu depois do F. C. Porto-Paços de Ferreira: estava desconten­te com a exibição relativamen­te banal da equipa. O resulta­do, 4-0, foi interessante: qua­tro golos saídos dos pés de Ri­cardo Quaresma e dois deles apontados por um defesa, Pe-pe. Houve quem pensasse que uma operação aritmética bási­ca bastava para descansar Je­sualdo (quatro golos à equipa que tinha ganho ao Sporting e empatado com o Benfica); fe­lizmente, o treinador lançou o aviso para compensar a ale­gria instalada desde a semana anterior, quando tinha lembra­do outra coisa básica - que é em jogos como aquele da Choupana, contra o Nacional, que se ganham campeonatos, e não apenas contra o Benfica e o Sporting.

Isso é bom de dizer, mas toda a gente sabe que não basta ga­nhar ao adversário; é preciso, dentro de certos limites, hu­milhá-lo um pouco para que não fique com um sorriso ao canto da boca. Adriaanse, o do molho holandês, não tinha percebido que era preciso ga­nhar ao Benfica no Dragão – e aqueles dois golos de Nuno Gomes foram "o sorriso ao canto da boca" até ao fim da época. Alguém, nessa altura, devia ter avisado Adriaanse; mas andavam ocupados com o processo disciplinar a Diego.

2. Devo desculpas a Pepe. Há três anos eu queria trocá-lo por outra coisa qualquer. Para se
vingar de fala-baratos como eu, Pepe revelou-se o melhor central a actuar em Portugal. Nada me im­pede de desejar que seja, mesmo, o melhor central português. Portu­guês, repito.

3. "Jogadores de eleição" é um tema recorrente, mas vale a pena lembrar enganos fatais. Durante urriEC. Porto-Braga, há uns anos, um comentador de serviço (na TSF) acabava de ver o mesmo que eu: Deco, esse português bravo, arrastava toda a defesa do então Estádio l.° de Maio para a direita e, num último momento, inflectiu, ficou diante de uma brecha por onde fuzilou o guarda-redes, Quim na época. Nunca esqueci esse golo nem o comen­tário ressentido do sujeito: "Ma­nhoso, Deco: Mas isso não mas­cara o facto de ser um jogador ba­nal." Não era. Um ano depois, num Belenenses-F. C. Porto, De­co toma a bola entre os pés na grande área e corre para a baliza adversária; faz o campo todo, su­porta três cargas e, diante da ba­liza, cede a Alenichev, seu con­corrente para o lugar, que faz o quarto golo. No Dragão, este ano, vi a mesma sequência de jogadas com Ricardo Quaresma e com Anderson. O comentador anda aí. O que disse de Deco, repetiu sobre Quaresma e de Anderson.

4. Ricardo Carvalho, Deco, Paulo Ferreira, Maniche, Derlei, Jorge Costa, Diego - todos saíram do F. C. Porto, tal como Mourinho. Em Fevereiro, o confronto com o Chelsea há-de fazer lembrar esse e outros pormenores. Mourinho não perdoa várias coisas e quer mostrar que o coração é um aci­dente na sua vida. Não é – mas ele quer mostrar. Fevereiro vai ser amargo.

in Topo Norte – Jornal de Notícias - 23 Dezembro 2006