janeiro 02, 2010

Ir às compras

1. O final do ano é sempre agradável de ver. Não só há um «campeão de Inverno» a reivindicar já meio título (viram como os jornais não festejaram o ceptro, só porque não é o Benfica?), como «os clubes vão às compras». Esta designação peca por moderada e tímida; não se trata de ir «às compras» – trata-se de fazer larguíssimos investimentos que alegram os adeptos mais cheios da fé que transcende os estádios.
A mania é portuguesa – de 1 a 26 de Dezembro, os terminais de Multibanco em Portugal registaram quase 3 mil milhões de euros de movimentos, sem falar de compras em cartão de crédito. De onde vem esse dinheiro? Do endividamento, dos bancos, dos empréstimos que flutuam de acordo com os milagres da temporada, e que mais tarde ou mais cedo hão-de ser reivindicados pelos credores. No caso do futebol, é preciso dizer que um jogador não se compra com o cartão do American Express – mas tem um preço. Claro que podemos fazer contas e proceder à devida «engenharia financeira» que tanto permite transferência de atletas como nos deixa pagar os legumes da sopa.
Eu tenho uma grande dificuldade em compreender essa engenharia, até porque em Portugal as contas saem sempre furadas. Como se recuperam vinte, trinta milhões de euros, se não há receitas provenientes da venda de jogadores (que, de qualquer modo, já estavam destinados à conta-corrente diária)? Não me lixem.

2. Contas furadas? Cá está o pessimista (eu). Em 2002, 2003, fartei-me de escrever que os estádios de Aveiro, Leiria, Algarve e Coimbra iriam dar prejuízo. Recebi insultos de leitores e houve jornais que me apontaram a dedo. Pois cá estamos: as câmaras de Aveiro e Leiria já pedem a demolição dos seus estádios porque não têm dinheiro para os aguentar. Alguém há-de arranjar uma «engenharia financeira» (termo muito vale-e-azevediano que deu no que deu) para resolver o que estava previsto que iria acontecer. Juntem-lhe a Alta Velocidade e vai ser uma festa.

in A Bola - 2 Janeiro 2010

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