junho 17, 2006

Meio golo de vantagem

A selecção mexicana mantém o fado que a acompanha desde 1954: a de jamais ter vencido dois jogos seguidos em Mundiais na Europa.

1. Escrevi que Angola não jogaria mais daquela maneira, com o atrevimento com que jogou contra Portugal; enganei-me redondamente. Com os do México a tocarem “rancheras”, em bando de mariachis, os angolanos mostraram que a vida é mesmo assim: como eles quiserem que seja, e enquanto quiserem, com jogadores cheios de garra. No final, os mexicanos falavam de um jogo sofrido – mesmo contra apenas dez angolanos depois da expulsão de André. As únicas palavras são de surpresa sobre este fenómeno angolano. Uma lição para todos. Agora, o México “tem mesmo” de ganhar a Portugal se quiser passar adiante. Mesmo por meio golo de vantagem.

2. Precisamente, na altura em que Scolari diz que não se importa de ganhar por esse meio golo de vantagem, diante do Irão, a Argentina dançou tango na Alemanha. Lucho lesionou-se e eu tive pena, mas o destino estava traçado daquela maneira, com seis golos marcados para que nos possamos rir dos que se satisfazem com “a margem mínima”. Ao contrário do que dizem os timoratos, não tem havido muita “margem mínima” – eu ainda estou a festejar a qualificação do Equador para a fase seguinte, sobretudo depois de ouvir um comentador a criticar a máscara de homem-aranha de Kaviedes. Mas ontem foi tango. Tango, milonga, o que quiserem: jogadas que deslizavam com um “bandoneon” à entrada da área, aquela velocidade de um passo de dança, aquele riso que faz o futebol arrasador e cheio de talento. Se a Argentina nos sair para a segunda fase (vamos chegar lá, não vamos?), a minha alma lusitana portar-se-á mal e será patriota, naturalmente – mas tenho de dizer, ressalvando, que este futebol foi limpinho, o da Argentina, foi talentoso. Não pela goleada; mas pelo jogo.

3. Espero que ganhemos hoje. Digo-o sem patriotismo; só pelo jogo. Espero que se possa mostrar um riso português, fantástico, na Alemanha. Espero que os rapazes joguem bem, que ganhem bem e que devolvam a alma à rapaziada. Mas que se batam. Quero é que o Irão vá para casa enriquecer urânio. Hoje.

in "Topo Norte", Jornal de Notícias - 17 Junho 2006