Bom proveito e pouca azia
1. Ontem pedi a derrota dos dois, de Itália e da França - quase consegui. Até a de Zidane. Mas os penáltis também são jogo, só assim se entendendo que a Itália seja hoje campeã do mundo de futebol. Significa isso que é a melhor de todas as selecções? Não. Trinta e duas vezes não. Podem argumentar-me que chegou à final com a perseverança e a paciência que geralmente a "squadra" usa para este efeito, começando mal, andando mal lá pelo meio, mas ultrapassando cada adversário com sabedoria. Eu, essa sabedoria não quero. Quero outra a do bom futebol. Milhares de portugueses que durante o Mundial me insultaram (porque ousei pronunciar a expressão "bom futebol") estão hoje felizes com a Itália campeã, eficaz, chata e matreira. Bom proveito e pouca azia, é o que lhes desejo.
Não vi a primeira parte do jogo - mas a segunda e o prolongamento deram-me uma ideia básica das coisas. Uns cientistas que eu li na imprensa gabaram-me a virtude da eficácia: tantos remates, tantos golos, divide-se por tanto, obtém-se uma média de eficácia. Ora bolas - até eu os mando aprender a ver futebol, eu que não saio do sofá nem da bancada. Se é disto que gostam, ó cientistas, o jogo que vemos é sempre diferente. Vós sacrificáveis Garrincha e Maradona, eu acho-os bom demais para serem vistos pelas vossas dioptrias. Ganhar? Sim, eu sei - é o mais importante em fases destas, finais, finalíssimas. Mas continuo a preferir a mão de Maradona ao circunspecto talento de Materazzi. Prefiro um livre marcado por Schuster a um penálti apontado por Grosso. E, ó memória, dá-me um Cubillas (e um Cruijff, um Didi, um Jairzinho) e entrega o Sagnol a estes cientistas. Bom proveito e pouca azia.
2. Os repórteres não se cansavam de chamar a atenção para o "espírito de grupo" e para a "grande amizade" entre os jogadores portugueses aclamados ontem no Jamor. Não sei onde foram desencantar tanta imaginação ao ver uns rapazes contentes por terem ficado em quarto lugar. Aclamai-os, ó repórteres; mas tento na língua. Não é o fim do mundo, calma (como dizia o Poeta), é apenas um pouco tarde para tanto espalhafato.
3. Até daqui a quatro anos.
in "Topo Norte", Jornal de Notícias - 9 Julho 2006
Não vi a primeira parte do jogo - mas a segunda e o prolongamento deram-me uma ideia básica das coisas. Uns cientistas que eu li na imprensa gabaram-me a virtude da eficácia: tantos remates, tantos golos, divide-se por tanto, obtém-se uma média de eficácia. Ora bolas - até eu os mando aprender a ver futebol, eu que não saio do sofá nem da bancada. Se é disto que gostam, ó cientistas, o jogo que vemos é sempre diferente. Vós sacrificáveis Garrincha e Maradona, eu acho-os bom demais para serem vistos pelas vossas dioptrias. Ganhar? Sim, eu sei - é o mais importante em fases destas, finais, finalíssimas. Mas continuo a preferir a mão de Maradona ao circunspecto talento de Materazzi. Prefiro um livre marcado por Schuster a um penálti apontado por Grosso. E, ó memória, dá-me um Cubillas (e um Cruijff, um Didi, um Jairzinho) e entrega o Sagnol a estes cientistas. Bom proveito e pouca azia.
2. Os repórteres não se cansavam de chamar a atenção para o "espírito de grupo" e para a "grande amizade" entre os jogadores portugueses aclamados ontem no Jamor. Não sei onde foram desencantar tanta imaginação ao ver uns rapazes contentes por terem ficado em quarto lugar. Aclamai-os, ó repórteres; mas tento na língua. Não é o fim do mundo, calma (como dizia o Poeta), é apenas um pouco tarde para tanto espalhafato.
3. Até daqui a quatro anos.
in "Topo Norte", Jornal de Notícias - 9 Julho 2006
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