agosto 14, 2010

Foguetório

Rui Moreira escreveu neste jornal, na semana passada (exactamente há uma semana), que era o FC Porto quem mais precisava de vencer a Supertaça Cândido de Oliveira. Meu Caro Rui, lamento discordar de si – se havia alguém que precisava desesperadamente de ganhar a Supertaça, de valorizar (como sabemos) os «seus activos» e de confirmar o favoritismo que lhe era quase unanimemente reconhecido, esse alguém era o Benfica.

Ao longo de uma semana, comentadores de todos os quadrantes («comentadores» que deviam manter alguma equidistância, na imprensa, na rádio e na televisão, uma vez que gostam de não assumir as suas preferências clubísticas) não se pouparam a trabalhos: enalteceram a «superioridade» moral, física e – praticamente – religiosa do Benfica; multiplicaram por várias parcelas a inequívoca qualidade do plantel do Benfica até altitudes estratosféricas; entoaram todos os salmos possíveis à pré-época do Benfica, não apenas animadora mas, também, avassaladora e digna de uma divisão germânica atravessando as barreiras; choraram lágrimas de fervor benfiquista, as que antecedem orgasmos celestiais, angélicos, divinos; finalmente, deram guarida a toda a espécie de desconfiança sobre o FC Porto, sobre o seu treinador e sobre a qualidade do plantel. Não foi por acaso, aliás, que nunca vi tanto jornalista e comentador desfazer-se em «mea culpas» providenciais nas edições de domingo passado, alguns deles confessando que tinham – olá, se tinham – exagerado.

Escuso de descrever, Caro Rui, a natureza e a qualidade do jogo do FC Porto. Mas gostava de lembrar que, de facto, perante a avalancha inusitada e despropositada de favoritismo, de foguetório, de louvores de igreja, era o Benfica que precisava mesmo de ganhar a Supertaça. Não só para fazer jus às suas naturais e legítimas ambições – mas para satisfazer uma clientela que festejou antes do jogo e que vaticinou as piores desgraças ao FC Porto. Teve razão André Villas-Boas ao dizer que a vitória na Supertaça foi, também, uma reparação, uma atitude séria contra a injustiça. No campo, como se viu. Não nos túneis do futebol.

in A Bola - 14 Agosto 2010

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