Já chegámos à Madeira
O Madeirense, em Lisboa, é um reduto histórico da cozinha da ilha. Mesmo com o passar dos anos, há ali um aroma de simpatia.
O grande problema dos que gostam de cozinha chinesa é a existência de restaurantes chineses, se me faço entender: nunca estão satisfeitos. Imagine-se alguém que goste verdadeiramente de cozinha mexicana; pois levem-no a um restaurante mexicano se querem vê-lo furioso: "Não, este não é o verdadeiro escabeche de Campeche, falta-lhe o 'achiote', falta-lhe aquele cominho." Em cada um de nós, adormecido e refastelado, há um fundamentalista. Nunca estamos satisfeitos. Falta sempre aquela coisa, "que só existe lá".
Pior do que isto só o tema "daquele restaurante que ninguém conhece". Aquele, pequenino, escondido, na rua tal. Ah, o tal? Não, do outro lado da rua, exactamente do outro lado, em frente a esse. Conheces aquela tasquinha, em – imaginemos -Freixo de Espada-à-Cinta, que serve um arroz de forno? Claro que conheço, é aquele. Não, não é, é uma rua abaixo, logo vi que ninguém conhece, só quem conhece muito bem o lugar é que consegue chegar lá.
Além do fundamentalista, existe, portanto, o geógrafo de becos. O geógrafo de becos desvaloriza tudo o que esteja numa rua principal e é muito amigo do paleontólogo – que é inimigo de todos os restaurantes que não usem "os ingredientes originais" ou, pelo menos, "aquela receita original". Pois, meus amigos, ninguém é realmente assim. Por detrás desse radicalismo de anedota, existe um ser humano naturalmente mentiroso. À melhor oportunidade encontramo-lo num Kentucky Fried Chicken, como qualquer cidadão que aprecia os 'sundaes' do McDonald’s.
Portanto, como o mundo é mundo, fui ao Madeirense comer pataniscas de bacalhau com arroz de feijão. O fundamentalista, envergonhado e indignado: "No Madeirense? Mas n'O Madeirense come-se espetada em pau de louro!"
Sim, mas os madeirenses, que também são gente, comem pataniscas e sabem fazê-las. Eu fui. O cabrito assado no forno à moda do pastor é também muito indicado (às terças), tal como os pastéis de bacalhau (às sextas) e o cozido à portuguesa (às quintas, dia tradicional).
Instalado no Amoreiras Shopping, encontra-se lá um resumo da gastronomia básica portuguesa; além dos pratos mencionados, o arroz de pato (às segundas), o polvo à lagareiro, o bife à Marrare, o bacalhau no forno – ao lado de sugestões essencialmente madeirenses (além das sopas: a de peixe, a de tomate e cebola e a açorda à madeirense). São elas as inevitáveis variantes dos filetes de peixe-espada com banana e maracujá, em vinha-d'alhos, com frutas e caril, com frutas e natas (hélas!), em cebolada ou com limão, terminando com uns rolinhos de espada com champanhe, que ainda não provei. Os meus preferidos: com cebolada e em vinha-d'alhos, como se sabia antes. Está na cara, não? Sou também adepto dos bifes de atum, de cebolada ou com molho vilão, desde que a generosidade da casa me proporcione uma quantidade substancial de milho frito. Molhar aqueles pedacinhos de milho frito (a nossa polenta) no molho vilão é – pessoalmente – um espectáculo dantesco. Sou fã. Eles sabem. No capítulo das carnes (passando de alto pelas gambas panadas ou fritas, com arroz - símbolo da simplicidade e da cozinha doméstica), chegamos então à espetada de lombo em pau de louro. Nada a dizer: pureza extrema, carne saborosa, absorvendo os odores de alho e louro. A carne em vinho e alhos com laranja é mais tradicional tal como o lombo assado com mel de cana ou o meu frango frito de vinho e alhos. Há ainda uma dezena de bifes à disposição – desde o simples "do lombo na brasa" até "com cogumelos", "de cebolada", "à portuguesa" ou "com gambas e natas", porque todos temos uma hipótese de errar.
Ao pedir o café, aparece milagrosamente um pastel de nata no pratinho, o que é muito boa lembrança. E dirá o fundamentalista: "E as sobremesas da Madeira?" Estão lá. Estou a pensar nos bifes de atum e nos cubinhos de milho, não me incomodem. Mas, por favor, à entrada sentem-se um pouco e provem um gin daqueles. E agradeçam ao Manuel Fernandes. Ele e O Madeirense são uma e a mesma coisa.
À Lupa
Vinhos: * * *
Digestivos: * * *
Acesso: * * * *
Decoração: * * *
Serviço: * * * *
Acolhimento: * * *
Mesa: * * *
Ruído da sala: * * *
Ar condicionado: * * *
Garrafeira
Vinhos tintos: 78
Vinhos brancos: 36
Espumantes & Champanhes: 10
Aguardentes portuguesas: 18
Colheitas tardias e moscatéis: 8
Portos & Madeiras: 30
Uísques: 16
Outros dados
Charutos: não
Estacionamento: fácil, no parque no Shopping
Levar crianças: sim
Área de não fumadores: não
Reserva: aconselhável ao almoço
Preço médio: 25 Euros
O MADEIRENSE
Centra Comercial Amoreiras - Loja 3027
Avenida Eng. Duarte Pacheco - Lisboa
Tel: 213830 827
Encerra aos domingos
in Revista Notícias Sábado – 10 Novembro 2007
O grande problema dos que gostam de cozinha chinesa é a existência de restaurantes chineses, se me faço entender: nunca estão satisfeitos. Imagine-se alguém que goste verdadeiramente de cozinha mexicana; pois levem-no a um restaurante mexicano se querem vê-lo furioso: "Não, este não é o verdadeiro escabeche de Campeche, falta-lhe o 'achiote', falta-lhe aquele cominho." Em cada um de nós, adormecido e refastelado, há um fundamentalista. Nunca estamos satisfeitos. Falta sempre aquela coisa, "que só existe lá".
Pior do que isto só o tema "daquele restaurante que ninguém conhece". Aquele, pequenino, escondido, na rua tal. Ah, o tal? Não, do outro lado da rua, exactamente do outro lado, em frente a esse. Conheces aquela tasquinha, em – imaginemos -Freixo de Espada-à-Cinta, que serve um arroz de forno? Claro que conheço, é aquele. Não, não é, é uma rua abaixo, logo vi que ninguém conhece, só quem conhece muito bem o lugar é que consegue chegar lá.
Além do fundamentalista, existe, portanto, o geógrafo de becos. O geógrafo de becos desvaloriza tudo o que esteja numa rua principal e é muito amigo do paleontólogo – que é inimigo de todos os restaurantes que não usem "os ingredientes originais" ou, pelo menos, "aquela receita original". Pois, meus amigos, ninguém é realmente assim. Por detrás desse radicalismo de anedota, existe um ser humano naturalmente mentiroso. À melhor oportunidade encontramo-lo num Kentucky Fried Chicken, como qualquer cidadão que aprecia os 'sundaes' do McDonald’s.
Portanto, como o mundo é mundo, fui ao Madeirense comer pataniscas de bacalhau com arroz de feijão. O fundamentalista, envergonhado e indignado: "No Madeirense? Mas n'O Madeirense come-se espetada em pau de louro!"
Sim, mas os madeirenses, que também são gente, comem pataniscas e sabem fazê-las. Eu fui. O cabrito assado no forno à moda do pastor é também muito indicado (às terças), tal como os pastéis de bacalhau (às sextas) e o cozido à portuguesa (às quintas, dia tradicional).
Instalado no Amoreiras Shopping, encontra-se lá um resumo da gastronomia básica portuguesa; além dos pratos mencionados, o arroz de pato (às segundas), o polvo à lagareiro, o bife à Marrare, o bacalhau no forno – ao lado de sugestões essencialmente madeirenses (além das sopas: a de peixe, a de tomate e cebola e a açorda à madeirense). São elas as inevitáveis variantes dos filetes de peixe-espada com banana e maracujá, em vinha-d'alhos, com frutas e caril, com frutas e natas (hélas!), em cebolada ou com limão, terminando com uns rolinhos de espada com champanhe, que ainda não provei. Os meus preferidos: com cebolada e em vinha-d'alhos, como se sabia antes. Está na cara, não? Sou também adepto dos bifes de atum, de cebolada ou com molho vilão, desde que a generosidade da casa me proporcione uma quantidade substancial de milho frito. Molhar aqueles pedacinhos de milho frito (a nossa polenta) no molho vilão é – pessoalmente – um espectáculo dantesco. Sou fã. Eles sabem. No capítulo das carnes (passando de alto pelas gambas panadas ou fritas, com arroz - símbolo da simplicidade e da cozinha doméstica), chegamos então à espetada de lombo em pau de louro. Nada a dizer: pureza extrema, carne saborosa, absorvendo os odores de alho e louro. A carne em vinho e alhos com laranja é mais tradicional tal como o lombo assado com mel de cana ou o meu frango frito de vinho e alhos. Há ainda uma dezena de bifes à disposição – desde o simples "do lombo na brasa" até "com cogumelos", "de cebolada", "à portuguesa" ou "com gambas e natas", porque todos temos uma hipótese de errar.
Ao pedir o café, aparece milagrosamente um pastel de nata no pratinho, o que é muito boa lembrança. E dirá o fundamentalista: "E as sobremesas da Madeira?" Estão lá. Estou a pensar nos bifes de atum e nos cubinhos de milho, não me incomodem. Mas, por favor, à entrada sentem-se um pouco e provem um gin daqueles. E agradeçam ao Manuel Fernandes. Ele e O Madeirense são uma e a mesma coisa.
À Lupa
Vinhos: * * *
Digestivos: * * *
Acesso: * * * *
Decoração: * * *
Serviço: * * * *
Acolhimento: * * *
Mesa: * * *
Ruído da sala: * * *
Ar condicionado: * * *
Garrafeira
Vinhos tintos: 78
Vinhos brancos: 36
Espumantes & Champanhes: 10
Aguardentes portuguesas: 18
Colheitas tardias e moscatéis: 8
Portos & Madeiras: 30
Uísques: 16
Outros dados
Charutos: não
Estacionamento: fácil, no parque no Shopping
Levar crianças: sim
Área de não fumadores: não
Reserva: aconselhável ao almoço
Preço médio: 25 Euros
O MADEIRENSE
Centra Comercial Amoreiras - Loja 3027
Avenida Eng. Duarte Pacheco - Lisboa
Tel: 213830 827
Encerra aos domingos
in Revista Notícias Sábado – 10 Novembro 2007
Etiquetas: Restaurantes
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