Esquilo e assobios
Passei o jogo com o Atlético de Madrid a jantar com um amigo benfiquista e dividi com ele o belo jogo de Fucile. Sempre gostei de o ver. Tem o ar matreiro do lado de cá do Rio da Prata – imagino-o a contar anedotas uruguaias sobre os argentinos. Uma das mais populares é a do uruguaio que pergunta se em Buenos Aires também conhecem «aquela música de Montevideo, o tango», o que leva qualquer argentino ao desespero e à indignação mais brutal, tentando ignorar que Gardel pode bem ter nascido no Uruguai, e que «La Cumparsita» foi composta em Montevideo. A alcunha de Fucile é «esquilo», o que lhe assenta bem, correndo pela lateral, atacando e defendendo, determinando as fronteiras naquele território – e, no caso, reduzindo o madridista Simão à insignificância. Separa-o do lateral um subtil toque de atrevimento e dureza, se bem que não relembre – pelo estilo e pela velocidade dos pés – o jeito de Bosingwa.
A outra boa surpresa em construção é Beluschi, naturalmente; já o tinha escrito aqui. Se numa orquestra é necessário haver um elemento que interprete o alinhamento geral, lendo a pauta de todos os instrumentistas, deslocando-se para ocupar os lugares vazios – esse alguém é Beluschi.
Eu não fui ver o jogo do Dragão contra o Atlético de Madrid, mas fui um dos que assobiou Simão Sabrosa lá dentro. Explico: o futebol é assim – assobiar, vaiar, festejar, rir, ulular. Nelson Rodrigues dizia que, no Maracanã (o estádio que leva o nome do seu irmão, Mário Filho), «até minuto de silêncio era vaiado».
Começo com isto por ter lido várias críticas ao comportamento dos adeptos nas bancadas (onde eu não estive, mas com quem partilhei a vaia) em relação a Simão Sabrosa e a Paulo Assunção. Esta ideia de um futebol asséptico disputado entre guerreiros no relvado parece-me absurda. Cada jogador sabe que não enfrenta apenas o onze adversário; enfrenta os milhares das bancadas – só isso lhe confere o estatuto de representante de uma tribo que defronta a outra. E deve sorrir diante das vaias, se tiver fibra de herói. De contrário é apenas isso: um adolescente que não cresceu.
in A Bola - 3 Outubro 2009
A outra boa surpresa em construção é Beluschi, naturalmente; já o tinha escrito aqui. Se numa orquestra é necessário haver um elemento que interprete o alinhamento geral, lendo a pauta de todos os instrumentistas, deslocando-se para ocupar os lugares vazios – esse alguém é Beluschi.
Eu não fui ver o jogo do Dragão contra o Atlético de Madrid, mas fui um dos que assobiou Simão Sabrosa lá dentro. Explico: o futebol é assim – assobiar, vaiar, festejar, rir, ulular. Nelson Rodrigues dizia que, no Maracanã (o estádio que leva o nome do seu irmão, Mário Filho), «até minuto de silêncio era vaiado».
Começo com isto por ter lido várias críticas ao comportamento dos adeptos nas bancadas (onde eu não estive, mas com quem partilhei a vaia) em relação a Simão Sabrosa e a Paulo Assunção. Esta ideia de um futebol asséptico disputado entre guerreiros no relvado parece-me absurda. Cada jogador sabe que não enfrenta apenas o onze adversário; enfrenta os milhares das bancadas – só isso lhe confere o estatuto de representante de uma tribo que defronta a outra. E deve sorrir diante das vaias, se tiver fibra de herói. De contrário é apenas isso: um adolescente que não cresceu.
in A Bola - 3 Outubro 2009
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