agosto 19, 2006

Noites de Cascais

Poucas mesas – mas uma luz delicada e tranquila. A Casa do Largo, em Cascais, liberta-se da sua memória e reabriu com mais apetite e conforto.

Ainda bem que já passaram aquelas vagas de canícula deste nosso lusitaníssimo Agosto que trouxeram noites irrespiráveis – sem um ventinho, um empurrão de fresco. Sei do que falo: de viver numa campânula aquecida pelas temperaturas do Verão. Embora raramente me falte o apetite, confesso que me indispõe o clima destemperado de Portugal que estudámos na escola da nossa adolescência.

Não sou, claramente, daqueles que acha que o calor é um inimigo do apetite, mas, enfim, reconheço a existência de uma predisposição, de, como dizem os brasileiros, “pintar um clima”. Ah, lembro agora: não me falem de clima.
Em Cascais existe, perto da Cidadela, um lugar aprazível: a Casa do Largo. Foi notícia de jornal há uns anos, não pelos motivos mais felizes (ah, conspirações da política & dos negócios!) – e reabriu recentemente com um novo projecto, nova decoração, novo ambiente e um cardápio feliz onde se distingue bem o que é almoço e o que é jantar. A sala de jantar, junto de janelas por onde se respira o ar da noite, é pequena mas confortável e bem iluminada. Num destes dias (noites), com um amigo, jantei muito agradavelmente na Casa do Largo – havia uma simpática lista de entradas onde pontificavam o pratinho de tomate com mozzarella, uma salada de bacalhau, peixe marinado em lima, tártaro de espadarte e salmão fumado, carpaccios (de polvo e de vitela) além de um “foie gras”, de um bom “chèvre” gratinado, de camarões salteados com alho e de duas primícias: os pimentos em azeite com migas e uns ovinhos mexidos com trompetes – saborosos e cheirosos, confirmei noutra noite a seguir.

A secção marítima divide-se em duas zonas – a do polvo, distribuída em polvinho panado com migas e polvo assado com batata à murro, e a do bacalhau, que alinha nas suas versões à Brás, assado com batatinhas ou sob o formato de pastéis (bolinhos estaladiços na verdade) com feijão frade, embora eu tenha comido um bacalhau à Romeu, síntese de uma das boas formas de preparar o peixe em Trás-os-Montes. Existe, aliás, uma razão para isso: os actuais responsáveis da Casa do Largo têm raízes transmontano-durienses e beirãs (foram responsáveis por uma magnífica unidade hoteleira em Penedono, onde se comia admiravelmente). Por isso, há sempre, além da lista normal e habitual da casa, um ou outro prato com genealogia nortenha. Agradece-se.

No capítulo das carnes, simplicidade: pastéis de massa tenra e saladas, uma vitela grelhada com batata, um suculento rosbife acompanhado de puré de batata, ‘magret’ de pato com puré de feijão (uma criação bastante recomendável), vitelinha das Alcáçovas com arroz de legumes e porco preto grelhado com milhos. Uma palavra sobre os milhos: são excelentes e valem a pena; em próxima visita vou pedi-los para acompanhar qualquer outro prato do cardápio, humedecidos, leves, transcendentes. Se alguém não alinhar no maniqueísmo carne & peixe, há ainda uma salada fria de arroz, uns cogumelos grelhados e perfumados de ervas com arroz de legumes e tofu gratinado com arroz árabe.

Escolhendo, para companhia, a opção de vinho a copo, isso permite provar com parcimónia e delicadeza algumas marcas decentíssimas (pena que não exista rosé a copo no Casa do Largo – um ‘Carm’ ficaria bem com algumas das entradas propostas…), e que antecedem um bolo de prata com doce de ovos, pudim conventual, bolo de chocolate (muito bom) e uma torta de noz também com doce de ovos além de um gelado de manga que muito recomendo. Para as noites serenas que se aproximam, e querendo suavizar a digestão, há uma boa lista de chás e tisanas.

O bar funciona até mais tarde que o restaurante propriamente dito, e fornece uma pequena lista de tira-gostos, petiscos e sanduíches (torradas com queijo fresco ou com ovos mexidos, picapau de lombo, tostas de rosbife ou de salmão, etc.) – tendo a decoração sido alterada e a casa arejada substancialmente, aí está um lugar descomprometido e apetitoso para o resto das nossas noites de Verão da Linha de Cascais.

À Lupa
Vinhos: * *
Digestivos: * * *
Acesso: * * *
Decoração: * * *
Serviço: * * *
Acolhimento: * * *
Mesa: * * *
Ruído da sala: * * *
Ar condicionado: * * *

Garrafeira
Vinhos Tintos: 52
Vinhos Brancos: 8
Vinhos Verdes: 6
Portos & Madeiras: 15
Uísques: 24
Aguardentes & Conhaques: 22

Outros dados
Charutos: Não
Estacionamento: Complicado (fácil à noite)
Levar Crianças: Não
Área Não Fumadores: Não
Reserva: Aconselhável ao almoço
Preço médio: 20 Euros
Cartões: MB, V, D, M, AM

Restaurante Casa do Largo
Largo da Assunção, 6 e 7
2750-298 CascaisTel: 21.831856 – 96 6189324
Encerra aos domingos
Jantares até às 00.00h

in Revista Notícias Sábado – 19 Agosto 2006